Em
tempos de performances pseudos libertárias e outros tipos de manifestações,
digamos pouco inteligíveis, um "artista" consegue se destacar dos
demais e se manter um longo tempo sob os holofotes, fazendo do seu personagem
um ícone da dramaturgia política brasileira. Sem papas na língua, chegado a uma
polêmica, defensor de ideias radicais e de comportamento explosivo, certamente
ele alavancaria a audiência de qualquer reality show televisivo, mas talvez
nunca fosse o campeão da disputa. Por que? Porque ele só está ali para criar
polêmica. Essa é a sua função. Nada mais.
Se
você pensa que estou falando do deputado Jair Bolsonaro, você acertou. O
intérprete do personagem "O mito" talvez seja o político mais
performático e o mais convincente na arte de atrair admiradores através da
falácia, que já vimos por aqui. Os seus seguidores certamente chamarão, a mim e
a qualquer outra pessoa que se recuse a vê-lo como o Darth Vader do congresso
nacional, de analfabeto político, de vagabundo, de esquerdista, de comunista,
de bolivariano, de beneficiários de bolsa família e etc de baboseiras. Isso a
gente já sabe! O que eu gostaria de saber, agora que o STF o indiciou como réu
por apologia e incitação ao estupro, é, qual e como será a nova performance
política do arquétipo de Hitler?
Acostumado
a usar a tribuna do plenário da câmara para vociferar que não tem medo de
perder o mandato e para mandar recados, sempre ofensivos e quase sempre
desrespeitosos, aos seus adversários políticos, o aprendiz de ditador vai
precisar se reinventar. Como mito, ele se coloca e admite que os seus seguidores
o coloque, acima do bem do mal. E como réu? Temos casos emblemáticos na nossa
teledramaturgia, de grandes atores que não convencem interpretando personagens
diferentes dos habituais. Ser pedra é bem mais cômodo do que ser vidraça, mas
todos nós já estivemos dos dois lados algum dia. A diferença é que quando não
jogamos pedra na vidraça dos outros, temos boas chances de ninguém jogar na
nossa.
Revendo
o vídeo de 2003, onde o deputado discute com a também deputada Maria do
Rosário, percebo o quanto o povo brasileiro está carente de bons exemplos na
nossa política e estendo a crítica à deputada envolvida no caso. Ela interfere,
sem ser convidada, na entrevista que Bolsonaro concedia a uma emissora de TV.
No mínimo falta de educação e bons modos de sua parte. Mas o que se sucede é
muito pior, se tratando de um parlamentar que almeja assumir a presidência do
país. Ao dizer que não estupraria a deputada por ela não merecer e chamá-la de
vagabunda, Bolsonaro explicita a sua falta de decoro, não só parlamentar, como
também moral.
Já
em outra entrevista, ele reafirma e acrescenta que "Ela não merece ser
estuprada porque é muito ruim, porque ela é muito feia, não faz meu gênero,
jamais a estupraria. Eu não sou estuprador, mas, se fosse, não iria estuprar,
porque não merece." Se isso não é apologia ao estupro é o que? A falta de
bom senso no uso das palavras expõem a ignorância dos arrogantes e daqueles que
julgam que as dominam muito bem. E como todo arrogante que se preza, a
justificativa para limpar a caca expelida pela boca é contextualizar o que foi
dito, chamando assim de idiota todos aqueles que entenderam de forma diferente,
o que só poderia ser entendido dessa forma.
Ah!
Mas ela o ofendeu primeiro. Ele apenas revidou. Ok! Esse é o argumento usado
por todos que escondem a sua verdadeira face, para externar, num momento de
raiva, o que está internalizado dentro de si. O racista no meio de uma
discussão chamaria o seu opositor de macaco e depois justificaria dizendo que
foi ofendido primeiro, quando na verdade ele apenas usou a discussão como
pretexto para expressar o que ele normalmente pensa e reprime no seu dia a dia.
Não que Bolsonaro seja um estuprador. Não é. Mas a estupidez e a infelicidade
de suas palavras, infelizmente, não admitem outra interpretação. Deu a entender
que se justifica o estupro de uma mulher bonita. Um postulante a presidência da
república não pode ser tão imprudente e inconsequente em suas declarações.
Se
condenado, pode ficar inelegível. O que não seria nada ruim para a sociedade e
poderia se aplicar da mesma forma, a deputada vítima no processo e a muitos
outros políticos que defendem causas duvidosas e que não visam o bem estar de
toda a coletividade. Ao que parece ele já começou a baixar o tom. Em entrevista
concedida após a decisão do STF, percebe-se um mito abatido e incrédulo com a
situação na qual se encontra. Jamais poderia imaginar que fosse indiciado. Logo
ele, o arauto da moralidade nacional, a salvação da pátria, o resgate da ordem
e da decência. Sem perceber, pediu clemência ao STF e por tabela a todas as
mulheres que se sentiram ofendidas com suas palavras, o que me fez avaliar que
ele fica melhor no papel de lobo mau. Como vítima não convence.
Aguardemos
as cenas dos próximos capítulos dessa novela. O ator não me parece muito a
vontade com o seu novo personagem. Os críticos estarão atentos a sua atuação.
Os fãs estarão prontos para lhe oferecer o Oscar, seja qual for o seu
desempenho. A justiça se encarregará de escrever o final dessa história. O
certo é que o mito, hoje é réu e caso não saia bem dessa fita, terá pela frente
o papel mais difícil da sua carreira. O de condenado. E tudo indica que esse
será o seu destino, a não ser que ele tire um novo coelho da cartola. Sem
performance.
Tchau,
mito!
Fonte:brasil247
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