Descentralizar
a gestão, valorizar o interior do Estado e incentivar os advogados a
participarem mais ativamente de suas atividades são as prioridades da nova
direção do Instituto Brasileiro de Direito de Família no Rio Grande do Sul para
o biênio 2014-2015. Os compromissos foram firmados pelos advogados Conrado
Paulino da Rosa (foto) e Delma Silveira Ibias, presidente e vice
respectivamente, que tomaram posse no último dia 22 de março, em Porto Alegre.
A solenidade reuniu a imprensa e cerca de 170 convidados na Associação Atlética
Banco do Brasil (AABB).
Durante
a solenidade, os dirigentes discorreram sobre a principal novidade da futura
gestão: a criação de 14 comissões para tratar de temas específicos do Direito
de Família. Além dos assuntos tradicionais, estudos constitucionais da família
e Direito Sucessório, aparecem temas como violência doméstica, proteção ao
idoso e bioética. Entre membros da diretoria executiva, do conselho fiscal e
das comissões especiais, mais de 50 associados integram a nova gestão.
O
objetivo de todo este esforço, segundo Conrado, é intensificar as ações nestas
matérias do Direito de Família para vencer o principal desafio: conseguir o
crescimento da atuação política, social e acadêmica da instituição. ‘‘Hoje,
temos cinco núcleos no interior: Bagé, Caxias do Sul, Passo Fundo, Santa Cruz
do Sul e Santa Rosa. Em abril, iremos instalar mais um em Santa Maria’’,
anunciou. Conrado disse que o Congresso Gaúcho de Direito de Família, que
acontece em maio, em Santa Cruz do Sul, será itinerante entre as demais cidades
do interior gaúcho.
O
Rio Grande do Sul é considerado inovador na área do Direito da Família, pois
produziu decisões paradigmáticas, como o reconhecimento de uniões de pessoas do
mesmo sexo, quando o assunto ainda era considerado tabu no Judiciário. Por isso,
os novos dirigentes tomam como marca estratégica o incentivo permanente à
produção de conhecimento científico, além da atualização profissional. Afinal,
estes estudos, no futuro, é que darão a base filosófica ou jurídica para o
reconhecimento de novas formas de relacionamento humano, levando a outros
formatos de família.
Perfil
Conrado
Paulino da Rosa é advogado especializado em Direito de Família, professor
universitário, escritor e mediador de conflitos. É doutorando em Serviço Social
pela PUC-RS e mestre em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc),
com defesa na Universitá Degli Studi di Napoli Federico II, na Itália.
Coordenador da Pós-Graduação em Direito de Família Contemporâneo e Mediação da
Faculdade de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul (Fadergs), também leciona na
Uniritter e em diversos cursos de pós-graduação de Santa Catarina, Goiás, Minas
Gerais e São Paulo. É autor de quatro obras sobre Direito de Família.
O
novo presidente falou com a ConJur sobre os principais temas que preocupam os
cerca de 600 associados do IBDFam gaúcho, dentre os quais a alienação parental,
a mediação, a interação com psicólogos e a assistentes sociais e até sobre
‘‘família virtual’’, assunto que o motivou a escrever um livro.
Leia
a entrevista:
ConJur
— Qual o grande desafio dos advogados que atuam no Direito de Família para
melhorar a prestação de seus serviços?
Conrado
Paulino da Rosa — Os operadores precisam se atualizar e se especializar.
Infelizmente, no Brasil, muito profissionais não se atualizam. É como ocorre na
Medicina. O profissional sem especialidade e sem experiência no Direito de
Família e no Direito das Sucessões não terá uma boa atuação. Então, o grande
marco vai se dar a partir do momento em que a população valorizar a necessidade
da especialização.
ConJur
— Qual o panorama da seccional gaúcha no conjunto da instituição?
Conrado
Paulino da Rosa — No Brasil, o IBDFam é um dos maiores institutos de Direito,
com 16 anos de história e mais de 7 mil associados – entre operadores do
Direito, do Serviço Social e da Psicologia. Neste cenário, proporcionalmente, a
seccional do RS é a maior e a mais atuante do Brasil, com certeza, embora São
Paulo conte com maior número de associados.
ConJur
— A política de promover eventos continua nesta nova gestão?
Conrado Paulino da
Rosa — Sim, e vamos ampliar. Nos últimos quatro anos, sob a presidência da
doutora Delma Silveira Ibias, realizamos pelo menos um grande evento por ano.
Nesta gestão que se inicia, a partir de 2014, vamos fazer dois eventos por ano
e também dois eventos mensais de caráter continuado. Já agendamos, neste
primeiro semestre, o 1º Congresso Gaúcho de Direito de Família, de 15 a 17 de
maio, em Santa Cruz do Sul e, no segundo semestre, o 6º Congresso Mercosul de
Direito de Família, de 4 a 6 de setembro, no hotel Plaza São Rafael, em Porto
Alegre. Os eventos acadêmicos viraram uma marca de excelência da nossa
seccional, levando ao crescimento do número de associados nos últimos anos.
ConJur
— Quer dizer, a busca incessante do conhecimento científico virou estratégia
permanente...
Conrado
Paulino da Rosa — Na verdade, nossa grande marca é a preocupação com a produção
do conhecimento científico. No ano passado, por exemplo, criamos o projeto que
se chama ‘‘Almoço em Família’’, porque somos um instituto que estuda a família.
Então, criamos esta reunião-almoço na segunda sexta-feira de cada mês e que
hoje já se tornou tradicional. Para quem não consegue ir no evento de
sexta-feira, promoveremos, no último sábado do mês, pela manhã, os colóquios em
Direito de Família e Direito das Sucessões, na Escola da Magistratura da
Associação dos Juízes do RS (Ajuris), em Porto Alegre. O nosso grande
diferencial é conciliar, acima de tudo, não só teoria, mas muito foco na prática.
Nós sabemos que o Direito de Família é um direito do caso concreto. Então,
precisamos muito do estudo continuado, que é tudo muito dinâmico no conceito de
família.
ConJur
— O IBDFam não abrange só o Direito de Família. Tem profissionais de áreas congêneres
que atuam em conjunto com os advogados. Qual a importância desta interação?
Conrado
Paulino da Rosa — O Direito de Família é o mais humano dos direitos, porque
lida com o amor. Mas o que chega até os operadores do Direito é a pior face do
amor. É por isso que incentivamos muito a prática interdisciplinar, porque de
nada vai ser o Direito sem o Serviço Social e a Psicologia. Tradicionalmente, o
curso trazia a ideia de que o profissional do Direito era autossuficiente.
Hoje, há um trabalho, efetivamente, conjunto, possibilitando que as pessoas
passem por este momento de crise com o menor sofrimento possível, a fim de que
a partilha dos bens ou a guarda dos filhos não sirva como instrumento de
vingança pelo fim do relacionamento.
ConJur
— Até que ponto estes profissionais contribuem para o expertise do instituto?
Conrado
Paulino da Rosa — Hoje, estes profissionais são essenciais para o sucesso do
nosso trabalho. O juiz, o promotor de Justiça e o advogado conhecem o Direito.
Mas como verificar qual o genitor que tem as melhores condições de ficar com a
guarda da criança? Isso só será possível saber a partir de uma perícia social,
feita por assistente social; ou do estudo psicológico, feito por psicólogo. É
por isso que, hoje, não dá para imaginar o Direito de Família sem estas áreas.
A mediação de conflitos, prática muito utilizada e que o novo Código de
Processo Civil dá um espaço privilegiado, é um conhecimento interdisciplinar.
ConJur
— A prática da mediação é vantajosa para todos? Também em relação aos
honorários do advogado?
Conrado Paulino da Rosa — Como o paradigma mudou, os advogados só têm a
ganhar com a mediação. Até há pouco tempo, o bom profissional do Direito era
aquele que sabia brigar. Hoje, é o que sabe negociar, pois irá trazer resultado
para o seu cliente em menos tempo. Afinal, somos prestadores de serviço. A
Constituição e a Emenda Constitucional 45 asseguram a todo brasileiro o direito
a uma razoável duração do processo. A mesma Constituição diz, no artigo 226,
que a família é a base da sociedade. Então, se o processo de Direito de Família
não andar rápido, estaremos colocando em risco a base da sociedade. A mediação
tem agregado muito, também, a nós advogados, porque somos o rosto do Poder
Judiciário. Se uma ação demora seis meses até a audiência, não é o juiz que
leva a carga, mas o advogado. Então, a utilização dessas ferramentas [de
mediação e conciliação] só tem a agregar não só à questão dos honorários, mas,
principalmente, pela melhoria da qualidade de atendimento.
ConJur
— A ferramenta chamada Depoimento Sem Dano, comumente usada no Judiciário
estadual para apurar abusos sexuais contra crianças, pode trazer benefícios
para a área de família, como a melhoria da prova oral?
Conrado Paulino da Rosa
— Dentro do Direito de Família, existem aqueles profissionais contrários a esta
prática. Eu sou muito simpático ao Depoimento sem Dano. Todas as ferramentas
que pudermos disponibilizar para minimizar os danos à criança são bem-vindas,
porque o filho é o que mais sofre num caso de alienação parental, por exemplo.
ConJur
— Como se dá esta alienação?
Conrado
Paulino da Rosa — A alienação parental decorre do desfazimento de vínculos,
quer do casamento, quer da união estável. Mas o que é esta alienação? Um dos
genitores passa a promover campanha de desqualificação do outro, começando por
falar mal deste, criando obstáculos para o direito de visitas. Ou seja, isso
impede a convivência entre genitor e o filho. Em casos extremos, o alienador
pode apresentar falsa denúncia de abuso sexual contra o ex-marido ou a
ex-mulher. E o que acontecia há um tempo atrás? Os juízes suspendiam a
convivência, e este pai só voltava a ter contato com o filho depois de dois
anos, e ainda de modo assistido. Então, dois anos, numa história de um filho de
quatro anos, é metade da vida. A ideia do alienador é criar um filho órfão de
pai vivo. Enfim, a alienação parental pode chegar nesse quadro preocupante e
que existe desde que o mundo é mundo.
ConJur
— Com a crise das famílias tradicionais, o IBDFam luta pelo reconhecimento
legal dos novos relacionamentos?
Conrado
Paulino da Rosa — A Constituição Federal de 1988 já inovou pelo fato que,
antes, só tínhamos o casamento enquanto família. A partir de então, passamos a
ter a união estável e a família monoparental, aquela formada por qualquer dos
pais e seus descendentes. Entretanto, como a Constituição não pode prever todos
os modelos possíveis de relacionamento, nós temos um papel muito grande na
formação da jurisprudência e da doutrina dos novos conceitos de família. O
afeto não está preso à vontade do legislador. A pessoa que deseja se realizar
afetivamente não vai abrir o Código Civil para ver se pode responder a um olhar
ou se pode se apaixonar por alguém. O afeto é muito dinâmico. Sempre trazemos o
estudo destas novas famílias, tanto formadas por pessoas do mesmo sexo como
aquelas chamadas mosaicos (ou pluriparental), que se formam a partir do
descasamento de pessoas com filhos. Tem ainda a família poliafetiva,
constituída por três pessoas que moram juntas; e as chamadas famílias
simultâneas.
ConJur
— E a possibilidade do relacionamento virtual, retratado no livro ‘‘iFamily: Um
Novo Conceito de Família’’, de sua autoria?
Conrado Paulino da Rosa —
O livro, lançado no ano passado, mostra que as tecnologias revolucionaram nossa
forma de agir, de trabalhar, de contratar e, é claro, a maneira de nos
relacionarmos afetivamente. Assim, defendo, também, a possibilidade de
constituição de uma família virtual, que seria denominada de ''iFamily''. A
ideia do livro é que distância física não é distância afetiva. Afetivamente, eu
posso, por uma rede social, estar perto de alguém que vive no Canadá, assim
como eu posso dividir a mesma cama com alguém me encontrando a quilômetros de
distância. Hoje, nós fechamos contratos via e-mail. Então, está chegando a hora
do Direito de Família se atualizar, reconhecendo outros modelos de famílias.
ConJur
— A instituição tem uma posição quanto à possibilidade de redução da maioridade
penal?
Conrado
Paulino da Rosa — Temos uma postura bastante rígida quanto à proteção dos
direitos da criança e do adolescente. Prova disso que no Congresso de Santa
Cruz do Sul, em maio, uma mesa-redonda irá discutir o trabalho infantil no
campo. Nós sabemos que é prática reiterada e que não existe infância com
trabalho. O próprio Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no artigo 15,
diz que a criança e o adolescente são uma pessoa em processo de
desenvolvimento, merecendo toda a proteção do Estado. Então, a redução de
maioridade penal é um discurso muito mais para angariar votos do que para a
realidade. O que nós precisamos é de um instrumento efetivo de aplicação de medidas
socioeducativas. Que se aplique o ECA, separando os adolescentes infratores por
idade, compleição física e gravidade do ato infracional. Precisamos garantir a
ideia de que o Estado deve educar esta pessoa em formação, e não apenas
puní-la, porque se sabe que isso não dá certo.
Fonte:
ConJur
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