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1)
Introdução:
Dentre
as principais novidades apresentadas pela Lei 13.105 de 16 de Março de 2015, o
Novo CPC, uma das mais interessantes é, sem dúvida, o regramento do instituto
da Justiça Gratuita, que até então era disciplinado pela Lei 1.060, uma
legislação obsoleta, com gênese nos remotos anos 50.
Malgrado
a jurisprudência tenha, no exercício de seu papel, modulado a Lei 1.060/50, com
o objetivo de adaptá-la às exigências dos dias atuais, é de bom alvitre o
advento de uma legislação moderna sobre o assunto, de modo a tornar o acesso à
justiça, previsto na CRFB como um direito fundamental, mais efetivo e apto a
espargir seus efeitos com maior segurança.
Caminhando
neste sentido, a Lei 13.105/2015 prevê, em seus Artigos 98 a 102, o novo regramento da Justiça Gratuita, ora consagrando de forma expressa temas já consolidados
pela jurisprudência e doutrina, ora inovando em disposições normativas.
Verifica-se, inclusive, que o Novo CPC atua no sentido de empregar com mais
técnica expressões pertinentes ao assunto em comento. Finalmente, em seu Artigo
1.072, o Novo CPC cuida de revogar expressamente diversos Artigos da Lei
1.060/50.
Por
essa razão, o presente texto tem como finalidade, de forma concisa, trazer
algumas impressões preliminares obtidas na análise dos artigos da Lei
13.105/2015 concernentes ao instituto da Justiça Gratuita.
2)
Da técnica de nomenclatura adotada pelo NCPC:
Inicialmente,
é digno de nota ressaltar a técnica do legislador ao tratar do assunto em
estudo na Lei 13.105 de 2015, usando a expressão “Da Gratuidade da Justiça” em
todos os textos normativos relacionados ao tema.
Percebe-se
que o Novo CPC, atuando em total conformidade com as lições doutrinárias, deixa
evidente a diferença existente entre os assuntos da “Gratuidade da Justiça” e
da “Assistência Judiciária Gratuita”.
Apesar
de ambos os institutos se fundamentarem no art. 5º, inciso LXXIV da CRFB, que
diz que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que
comprovarem insuficiência de recursos”, e muitas vezes causarem embaraços nos
operadores do direito, eles não se confundem.
Ao
compulsarmos a Lei 1.060/50, que até o advento do Novo CPC ainda era a
legislação aplicada integralmente para reger o assunto, verificamos a evidente
despreocupação do legislador com a técnica de nomenclatura, sendo facilmente
detectado em seus textos normativos o freqüente uso da expressão “assistência
judiciária” para se referir à “gratuidade de justiça”.
Para
deixar a ideia que estamos tentando passar mais clara, como exemplo, eis o que
diz o Artigo 3º da Lei 1.060/50: “Art. 3º. A assistência judiciária compreende
as seguintes isenções: (...)”. Na toada do que se defende neste tópico, a
melhor técnica legislativa seria a utilização da expressão “A gratuidade da
justiça compreende as seguintes isenções”.
É
exatamente essa preocupação técnica com a nomenclatura que encontramos no Novo
CPC.
Como
dito acima, os institutos jurídicos não se confundem e o NCPC atua de forma
correta ao primar pela técnica na redação de seus textos normativos.
A
assistência Judiciária Gratuita é o direito da parte de ter um advogado do
Estado gratuito, função exercida precipuamente pela Defensoria Pública, mas
também encontrada em outros campos, como, por exemplo, nos Núcleos de Prática
Jurídica das Faculdades de Direito.
Noutro
giro, nos dizeres de Pontes de Miranda, o benefício da justiça gratuita “é
direito à dispensa provisória de despesas, exercível em relação jurídica processual,
perante o juiz que promete a prestação jurisdicional”.
Percebe-se,
dessarte, que o legislador, atento às características diversas dos institutos,
se preocupou, de forma totalmente louvável, em atuar com retidão no uso das
expressões normativas, deixando a legislação em total consonância com as lições
doutrinárias mais abalizadas sobre o tema.
3)
Pressuposto da Gratuidade de Justiça:
O
atual regramento da gratuidade de justiça, desenhado pelo Novo CPC, traz
inovação importante no âmbito dos pressupostos para sua concessão, enxugando as
exigências em relação ao que era visto no artigo 2º, parágrafo único da Lei
1.060/50.
Para
demonstrar a afirmação supra, pensamos ser interessante trazer um comparativo
das redações dos artigos concernentes ao assunto, especificamente artigos 2º,
parágrafo único da Lei 1.060/50 em confronto com o “caput” do Artigo 98 do Novo
CPC.
Lei
1.060/50:
Art.
2º. Gozarão dos benefícios desta Lei os nacionais ou estrangeiros residentes no
país, que necessitarem recorrer à Justiça penal, civil, militar ou do trabalho.
Parágrafo
único. - Considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele cuja
situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários
de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.
Lei
13.105/2015:
Art.
98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência
de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários
advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.
Percebe-se,
assim, de plano, que a novel legislação extirpa do ordenamento positivo a
famigerada exigência do requisito “sem prejuízo do sustento próprio ou da
família”, que estava previsto nos Artigos 2º e 4º da Lei 1.060/50, e
corriqueiramente era vistos nos modelos de “Declaração de Pobreza”.
Com
o advento do Novo CPC, basta a afirmação da parte requerente de sua
“insuficiência de recursos” para o deferimento do pleito, sendo de nenhuma
importância falar-se em “prejuízo de sustento próprio ou da família”.
Ademais,
é importante registrar que a afirmação de insuficiência de recursos da pessoa
natural goza de presunção de veracidade, devendo o magistrado exigir
comprovação da alegada “insuficiência de recursos” apenas quando localizar,
dentro do próprio feito, indícios razoáveis de que o pleito é temerário.
Trata-se, em verdade, de reafirmação de regra já vista na Lei 1.060/50 e com
total ressonância na jurisprudência.
A
regra em relação à concessão do beneficio às Pessoas jurídicas não é a mesma, e
será vista abaixo.
Neste
momento é importante ressaltar ainda que o Novo CPC consagra expressamente
outro entendimento da jurisprudência majoritária, mas que ainda encontrava
alguns defensores contrários, ou seja, de que o simples fato de a parte estar
representada por advogado particular no feito não é causa bastante para o
indeferimento do pleito de gratuidade de justiça. Cuida-se do § 4º do Artigo 99
do Novo CPC.
Logicamente
que, caso haja recurso versando exclusivamente sobre questão atinente aos
honorários advocatícios do representante da parte, o beneficio da justiça
gratuita eventualmente concedido a ela, não terá extensão ao procurador, salvo
se ele também requerer e preencher os requisitos legais que o autorizam.
Verificamos,
ademais, que a lei cuida expressamente desse caráter pessoal do beneficio da
justiça gratuita, em seu Artigo 99, § 6º, dizendo que não há extensão de seus
efeitos aos litisconsortes e nem mesmo aos sucessores processuais do
beneficiário.
Por
fim, disposição interessante albergada pelo Novo CPC, em seu Artigo 105, é a
exigência expressa de poderes especiais na procuração, ao advogado da parte que
pleiteia o beneficio da justiça gratuita, para assinar declaração de
hipossuficiência econômica.
4)
Beneficiários da Gratuidade de Justiça:
Consoante
dito acima, a pessoa natural, logicamente, é beneficiária da justiça gratuita,
gozando sua afirmação, inclusive, por força do § 3º do Artigo 99 do Novo CPC,
de presunção de veracidade.
Ocorre
que o Novo CPC cuidou de trazer expressamente, no “caput” do Artigo 98, a
previsão de que as Pessoas Jurídicas e o estrangeiro também poderão ser
beneficiários da justiça gratuita.
No
que concerne à pessoa do estrangeiro, verificamos que o Novo CPC acaba com a
restrição feita pela Lei 1.060/50, que limitava a aplicação do benefício ao
estrangeiro “residente no país”, conforme Artigo 2º, e amplia a incidência da
norma, dizendo apenas que o “estrangeiro” fará jus à concessão do beneficio
quando preenchido os requisitos legais.
Como
parêntese, cumpre anotar que o estrangeiro, em sendo pessoa natural, goza das
mesmas benesses do § 3º do Artigo 99 do Novo CPC, ou seja, da presunção de
veracidade da afirmação.
Já
as Pessoas Jurídicas apresentam regramento diverso.
Em
verdade, o Novo CPC encampou, no que tange à gratuidade de justiça estendida às
Pessoas Jurídicas, o entendimento já sedimentado pelo STJ, na Súmula de nº 481,
que diz: “Faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem
fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos
processuais.”
O
que se nota de diferença em relação à concessão do benefício às Pessoas
Naturais, é a inexistência de presunção legal de veracidade da afirmação de
insuficiência de recursos pela Pessoa Jurídica.
Ou
seja, a Pessoa Jurídica deverá comprovar nos autos em que pleiteia o beneficio
da justiça gratuita, o pressuposto exigido no Artigo 98 do Novo CPC, que é “a
insuficiência de recursos”, sob pena de ter seu pedido indeferido.
Nesse
particular, o Novo CPC adota presunção de que a Pessoa Jurídica tem recursos
suficientes para arcar com as despesas processuais, devendo ela desincumbir-se
de seu ônus levando ao feito a comprovação contrária.
De
fato caminha bem o legislador processual civil, pois impedir a concessão do
benefício às pessoas jurídicas afronta a norma constitucional insculpida no
art. 5º, inciso LXXIV, a qual estabelece que “Estado prestará assistência
jurídica e integral aos que comprovarem insuficiência de Recursos”. Entretanto,
é certo que o tratamento jurídico das pessoas jurídicas não poderia ser
idêntico àquele dispensado às pessoas naturais.
5)
Abrangência da Gratuidade de Justiça:
O
§ 1º do Artigo 98 do Novo CPC foi o responsável por arrolar o âmbito de
abrangência da gratuidade de justiça, contando com nove incisos, ou seja, há um
rol de quais atos processuais são abrangidos pela benesse da Justiça Gratuita,
desobrigando o beneficiário de adiantar os custos.
Mencionado
dispositivo legal corresponde ao que dizia o Artigo 3º da Lei 1.060/50, e traz
algumas inovações importantes, dignas de nota.
Inicialmente,
cumpre alertar que o § 4º do Artigo 98 do Novo CPC vaticina expressamente que
as multas processuais impostas à parte beneficiária da justiça gratuita não
estão acobertadas pela benesse.
No
que tange especificamente ao campo de abrangência da justiça gratuita,
observamos de novidade a inserção do inciso VII no Artigo 98, § 1º, pelo Novo
CPC, que traz para o rol de atos processuais abarcados pela gratuidade de
justiça a elaboração de memória de cálculo pelo contador do juízo ou por
“expert” nomeado pelo magistrado, quando houver exigência deste pressuposto
para instauração da execução.
Verifica-se
uma preocupação do legislador com a promoção de uma prestação jurisdicional
eficaz, pois não há dúvidas de que só se alcançará este objetivo com a entrega
efetiva do bem da vida ao jurisdicionado, não sendo bastante que o Estado
apenas reconheça seu direito, sendo medida que impera dar acuidade aos comandos
executivos.
Dessarte,
em sendo a memória de cálculo requisito indispensável para início da execução
em alguns casos, o legislador oferece efetividade prática ao sistema normativo
inserindo o inciso VII no Artigo 98, § 1º, no Novo CPC.
Entretanto,
não há nenhum exagero em afirmar que a hipótese mais polêmica e que mais chamou
a atenção foi o inserido no inciso IX, do § 1º do Artigo 98 do Novo CPC, que
diz o seguinte:
§
1o A gratuidade da justiça compreende:
(...)
IX
- os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência da prática
de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial necessário à efetivação
de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o benefício
tenha sido concedido.
Mencionada
disposição legal, evidentemente contrária aos interesses dos Cartórios, foi a
grande inovação trazida no rol de abrangência da gratuidade de justiça.
A
aplicação de mencionado inciso implica em dizer, por exemplo, que o vencedor de
uma demanda judicial de usucapião, beneficiário da justiça gratuita, fará jus
ao registro do imóvel com isenção de emolumentos cartorários, o que sem
dúvidas, apresenta grande inovação ao sistema até então em vigor e evidente
mudança de paradigma.
Como
forma de outorgar aos Cartórios uma contrapartida à novidade exposta acima, o §
8º do Artigo 98 trouxe para as Serventias Extrajudiciais um mecanismo de
controle aos abusos que poderão surgir na prática por parte dos beneficiários
da justiça gratuita.
De
acordo com o mencionado § 8º do Artigo 98, verificando o notário ou registrador
a existência de dúvidas quanto ao preenchimento atual dos pressupostos legais
de autorização da benesse da gratuidade de justiça, após praticar o ato, poderá
requerer ao juízo da causa a revogação, total ou parcial, do benefício, ou a
sua substituição pelo instituto do parcelamento, que será visto em tópico
abaixo.
Destaca-se
que em caso de suscitação de dúvida pelo Cartório, o juízo da causa deverá
obedecer ao contraditório e à ampla defesa, conferindo o prazo de 15 (quinze)
dias para o beneficiário da justiça gratuita se manifestar acerca das alegações
formuladas pelo notário ou registrador.
O
ponto que chama atenção é a exigência legal de que o notário ou registrador,
mesmo nos casos em que suscitar dúvida, pratique o ato antes de enviar o
requerimento de revogação ou de parcelamento ao Juízo da causa.
Como
forma de dar harmonia ao sistema, e conferir ao Cartório alguma espécie de
garantia, em contraponto à exigência de prática do ato mesmo em caso de fundada
dúvida, existe previsão que emerge do artigo 784, inciso XI, do Novo CPC, e que
diz:
Art.
784. São títulos executivos extrajudiciais:
(...)
XI
- a certidão expedida por serventia notarial ou de registro relativa a valores
de emolumentos e demais despesas devidas pelos atos por ela praticados, fixados
nas tabelas estabelecidas em lei;
Portanto,
entendendo o magistrado pela hipótese de revogação total ou parcial da
gratuidade de justiça da parte, o notário, ato contínuo, expedirá certidão
relativa a valores dos emolumentos e demais despesas devidas pelos atos
praticados, fixados nas tabelas estabelecidas em lei, que servirá como título
executivo extrajudicial.
É
de se anotar, por oportuno, que o Novo CPC, no que tange aos demais atos
acobertados pela gratuidade de justiça, manteve as disposições da Lei 1.060/50,
reproduzindo-as com alguns aprimoramentos de redação nos incisos do § 1º do
Artigo 98, a saber: as taxas ou as custas judiciais; os selos postais; as
despesas com publicação na imprensa oficial, dispensando-se a publicação em
outros meios; a indenização devida à testemunha que, quando empregada, receberá
do empregador salário integral, como se em serviço estivesse; as despesas com a
realização de exame de código genético - DNA e de outros exames considerados
essenciais; os honorários do advogado e do perito e a remuneração do intérprete
ou do tradutor nomeado para apresentação de versão em português de documento
redigido em língua estrangeira; os depósitos previstos em lei para interposição
de recurso, para propositura de ação e para a prática de outros atos
processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório.
Finalmente,
é digno de nota registrar um silêncio do Novo CPC em relação ao que era visto
no Artigo 1.124-A, § 3º do CPC de 1973, que tratava especificamente de tópico
relativo ao divórcio consensual e separação consensual, não reproduzido pela
novel legislação processual. Eis o que dizia aludido artigo do revogado CPC:
Art.
1.124-A. A separação consensual e o divórcio consensual, não havendo filhos
menores ou incapazes do casal e observados os requisitos legais quanto aos
prazos, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as
disposições relativas à descrição e à partilha dos bens comuns e à pensão
alimentícia e, ainda, ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome de
solteiro ou à manutenção do nome adotado quando se deu o casamento.
(...)
§
3º do Artigo 1.124-A: “A escritura e demais atos notariais serão gratuitos
àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei.”
A
não reprodução deste dispositivo faz surgir uma indagação: Ante a omissão
legislativa, a escritura e os demais atos notariais continuam gratuitos aos que
declararem com insuficiência de recursos?
A
resposta é positiva, devendo ser aplicado o regramento geral de concessão do
beneficio da justiça gratuita. Pensar o contrário seria lesar o princípio da
“vedação ao retrocesso social”, o que é inadmissível.
6)
Da responsabilidade do beneficiário da justiça gratuita:
Os
§§ 2º e 3º do Artigo 98 do Novo CPC reafirmam regra antiga, que já encontrava
assento na Lei 1.060/50, contudo, melhora sobremaneira a redação dos
dispositivos, deixando o assunto imune a interpretações divergentes.
Inicialmente,
para melhor entendimento do tópico, pensamos ser importante a reprodução de
mencionados dispositivos legais:
Art.
98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência
de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários
advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.
(...)
§
2o A concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário
pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua
sucumbência.
§
3o Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão
sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se,
nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as
certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de
insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade,
extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.
Resta
claro, assim, de acordo com o § 2º do Novo CPC, que a gratuidade de justiça não
é capaz de afastar a responsabilidade do vencido em relação às verbas
decorrente de sua sucumbência.
Desta
forma, o magistrado deverá proferir sentença condenando o beneficiário da
justiça gratuita às despesas processuais e aos honorários advocatícios, dentro
das regras normativas concernentes ao assunto, sem nenhuma diferenciação.
O
que ocorre, pelo deferimento da benesse da justiça gratuita, é que as
obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão acobertadas pelo o manto de
uma condição suspensiva de exigibilidade pelo prazo de 05 (cinco) anos,
conforme o ensinamento do § 3º do Artigo 98 do Novo CPC.
Isso
quer dizer que a parte contrária, detentora dos créditos decorrentes da
sucumbência, terá a possibilidade de, dentro de 05 (cinco) anos, comprovar a
mudança da situação financeira do beneficiário da justiça gratuita, e
prosseguir com a execução das aludidas verbas.
Frise-se,
por oportuno, que findo o prazo de 05 (cinco) anos, contados do trânsito em
julgado da sentença que condenou o beneficiário da justiça gratuita nas verbas
de sucumbência, a obrigação é extinta, por força da parte final do mesmo § 3º
do Artigo 98 do Novo CPC.
7)
Da possibilidade de modular a justiça gratuita:
Situação
extremamente interessante e de evidente importância prática é a possibilidade
expressa introduzida pelo Novo CPC do magistrado modular a concessão da
gratuidade da justiça, ora a concedendo de forma parcial, ora a negando, mas
conferindo à parte a possibilidade de pagar as despesas de forma parcelada.
Mencionadas
inovações normativas estão insculpidas nos §§ 5º e 6º do Artigo 98 do Novo CPC,
e conferem ao magistrado maior flexibilidade para, de acordo com o caso
concreto, modular de forma mais eficaz a concessão do beneficio da justiça
gratuita.
Para
ilustrar e dar maior efetividade à compreensão do assunto desenvolvido neste
momento, eis o que diz aludidos dispositivos legais:
Art.
98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência
de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários
advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.
(...)
§
5o A gratuidade poderá ser concedida em relação a algum ou a todos os atos
processuais, ou consistir na redução percentual de despesas processuais que o
beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento.
§
6o Conforme o caso, o juiz poderá conceder direito ao parcelamento de despesas
processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento.
Como
exemplo, não é incomum que o magistrado verifique num determinado caso concreto
que a parte tem condições financeiras para adiantar as custas judiciais, mas
não as possui para efetuar o adiantamento dos honorários periciais. Com a
inserção do § 5º do Artigo 98 no Novo CPC, passa-se a ser expressamente
possível que o magistrado module os efeitos da concessão do beneficio da
justiça gratuita e o conceda apenas em relação ao adiantamento dos honorários
periciais, com a manutenção da exigência de adiantamentos de outras despesas.
Ademais,
pode ser verificado no caso concreto, ainda com maior freqüência, que a parte
efetivamente não possui condições de efetuar o adiantamento de determinada
despesa processual de uma só vez, mas que o seu parcelamento torna o pagamento
possível, incapaz de comprometer a situação financeira da parte requerente.
O
instituto do parcelamento, agora previsto no Novo CPC, em última análise, prestigia
o principio da igualdade, o que era deixado de lado na Lei 1.060/50, que não
conferia ao magistrado um “meio termo”.
Portanto,
entendemos que tais mudanças representam grande avanço normativo, totalmente
condizente com a atualidade, conferindo grande efetividade ao acesso à justiça.
8)
Forma de pedir a justiça gratuita:
A
forma de a parte pedir a justiça gratuita também foi modificada com o advento
do Novo CPC, com a nítida finalidade de torná-la mais simplificada.
De
acordo com o Artigo 99, “caput” do Novo CPC, o pedido de justiça gratuita
deverá ser feito na primeira petição a ser interposta no feito, ou seja, na
petição inicial, contestação e, em caso de terceiros, na petição de ingresso ou
ainda em recurso.
Em
caso de pedido superveniente deverá ser feito por mera petição a ser
atravessada nos próprios autos do processo e não suspenderá o curso da demanda,
conforme redação do § 1º do Artigo 99 do Novo CPC.
Conforme
se pode depreender do Artigo 1.072 do Novo CPC, o Artigo 6º da Lei 1.060/50 -
que mencionava que o pedido de justiça gratuita formulados no curso do processo
deveria ser processado em autos apartados - foi expressamente revogado,
trazendo o Novo CPC, também nesse particular, uma reformulação procedimental.
Caso
seja a hipótese do pedido de gratuidade de justiça ser formulado apenas em grau
de recurso, consagrando entendimento majoritário da jurisprudência pátria, o §
7º do Artigo 99 do Novo CPC, aduz que a parte estará dispensada de realizar o
preparo, devendo o Relator apreciar o pleito e, caso entenda pelo
indeferimento, conceder prazo à parte para recolhimento das verbas devidas. Tal
situação, aliás, guarda nítida pertinência com o Artigo 10 do Novo CPC, que
trata do chamado “dever de consulta”, corolário do dever de cooperação
amplamente difundido na norma processual civil.
9)
Impugnação das decisões:
O
assunto da impugnação às decisões relativas à justiça gratuita era tratado pelo
criticado Artigo 17 da Lei 1.060/50, que dizia: “Caberá apelação das decisões
proferidas em consequência da aplicação desta lei; a apelação será recebida
somente no efeito devolutivo quando a sentença conceder o pedido”.(grifo
nosso).
Por
força do supramencionado artigo, todas as decisões proferidas em decorrência da
aplicação da Lei 1.060/50 desafiavam a interposição de apelação, seja em caso
de concessão, indeferimento, revogação ou não revogação da benesse.
A
principal crítica feita era de que nenhuma destas decisões são sentenças. A
doutrina, então, tentava dar alguma razoabilidade à interpretação do
dispositivo ensinado que só caberia apelação se as decisões fossem proferidas
em autos apartados, ou seja, em caso de revogação da benesse e concessão
superveniente da mesma.
O
Novo CPC, por sua vez, em total consonância com as lições da doutrina mais
abalizada sobre o assunto, revogou expressamente o Artigo 17 da Lei 1.060/50,
por intermédio do seu Artigo 1.072, e regulamentou o sistema de impugnação das
decisões no seu Artigo 101.
Agora,
contra as decisões que indeferir ou acolher o pedido de revogação da gratuidade
de justiça, o recurso cabível é o agravo de instrumento, conforme inciso V do
Artigo 1.015 do Novo CPC.
Quanto
à decisão que deferir o pedido de gratuidade de justiça, cabe à parte contrária
requerer a revogação da benesse na primeira oportunidade que manifestar no
processo, não tendo sentido a existência de recurso nesta hipótese.
Por
fim, no que tange à decisão que não revogar a concessão do pedido de gratuidade
de justiça o meio de impugnação deverá ser eventual apelação, em tópico
preliminar, uma vez que não é o caso da interposição de agravo de instrumento,
que com o advento do Novo CPC só terá cabimento nos casos expressamente
previsto em lei.
Registre-se
que o Artigo 1.072 do Novo CPC revogou o Artigo 7º da Lei 1.060/50, que dizia
que a parte contrária poderia, em qualquer fase da lide, requerer a revogação
dos benefícios da justiça gratuita, desde que provasse a inexistência ou o
desaparecimento dos requisitos essenciais à sua concessão. Conforme se pode
verificar neste tópico, o Novo CPC trouxe novos contornos procedimentais, que
fecham um sistema lógico e harmônico.
Por
fim, verifica-se, ao se analisar o § 1º do Artigo 101 do Novo CPC, que o agravo
de instrumento interposto contra as decisões que revogam ou indeferem a justiça
gratuita, tem efeito suspensivo automático, uma vez que a parte recorrente
estará dispensada de recolher as custas até a decisão do relator.
10)
Natureza jurídica da decisão que revoga o benefício da justiça gratuita:
De
acordo com o Artigo 102 do Novo CPC, resta certo que a decisão que revoga a
benesse da justiça gratuita possui natureza retroativa, devendo a parte efetuar
o recolhimento de todas as despesas processuais de cujo adiantamento foi
dispensado no prazo fixado pelo juiz.
Eis
a redação do Artigo 102 do Novo CPC:
Art.
102. Sobrevindo o trânsito em julgado de decisão que revoga a gratuidade, a
parte deverá efetuar o recolhimento de todas as despesas de cujo adiantamento
foi dispensada, inclusive as relativas ao recurso interposto, se houver, no
prazo fixado pelo juiz, sem prejuízo de aplicação das sanções previstas em lei.
O
não recolhimento das verbas implicará na extinção do processo sem resolução de
mérito, caso seja obrigação do autor efetuar o recolhimento. Nas demais
hipóteses, não será deferida a realização de nenhum ato ou diligência requerida
pela parte enquanto não efetuado o recolhimento.
11)
CONCLUSÃO:
Do
exposto, verifica-se que o Novo CPC trouxe, em boa hora, um novo regramento
para a justiça gratuita, renovando o modelo até então disciplinado pela Lei
1.060/50, deixando o sistema condizente com as lições doutrinárias mais
abalizadas e em sintonia com a jurisprudência majoritária sobre o assunto.
O
certo é que, com o advento do Novo CPC, evidentemente a benesse da justiça
gratuita estará regrada de forma bem mais lógica, apresentando maior segurança
aos usuários dos serviços judiciais e extrajudiciais abrangidos por sua
aplicação.
Fonte:
JusBrasil
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