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CREDIT SUISSE: CONFIANÇA EM TEMER ESTÁ ACABANDO



247 – O presidente interino, Michel Temer, pode estar deixando se esvair o suposto sentimento de otimismo na economia e a confiança do setor econômico para implementar medidas impopulares a fim de ajustar as contas fiscais do País. Para o economista-chefe do Credit Suisse no Brasil, Nilson Teixeira, o governo tem demorado para dar andamento a propostas nesse sentido, agindo, na verdade, de forma contrária ao ajuste fiscal, a fim de consolidar o impeachment.
Em artigo publicado no Valor Econômico nesta quarta-feira 27, Nilson Teixeira afirma que em vez de Temer ter proposto "medidas econômicas fortes" para construir "um ambiente mais favorável à retomada sustentável", está fazendo o "contrário", apoiando, ou até mesmo capitaneando, "diversas decisões que contrariam a consolidação fiscal".
Ele dá como exemplo "os reajustes de salários para a elite do funcionalismo público, a ampliação do Simples, a elevação do benefício do Bolsa Família acima da proposta pelo governo afastado, a não compensação de eventual déficit de entes regionais pelo governo central e a renegociação da dívida dos Estados com contrapartidas pouco restritivas".
"A postergação do anúncio da maioria das medidas necessárias e as decisões que elevaram o déficit fiscal confirmam que o governo interino optou por evitar qualquer risco de reversão do impeachment", escreve o PhD em economia. Ele prevê ainda que, "quanto mais próximo das eleições de 2018 e das definições dos partidos políticos sobre coligações para as eleições presidenciais e estaduais, mais difícil será angariar apoio de 308 deputados e 49 senadores para aprovar reformas que imponham redução de direitos dos eleitores".
"O passado recente demonstra que a percepção pode piorar repentinamente, por exemplo, com uma mudança no ambiente global. Nesse caso, o otimismo evapora; e, em algum momento, o benefício da dúvida expira. O tempo para a construção de um ambiente mais favorável à retomada sustentável da atividade está contando ou, de outra forma, acabando. Ao fim, as promessas não comprarão mais tempo, e a crise pode retornar", analisa.
Leia abaixo a íntegra do artigo:
Confiança pode expirar em novembro
Por Nilson Teixeira
A meta de déficit primário do setor público de R$ 143,1 bilhões para 2017, que já inclui receitas não recorrentes, não sinaliza uma expressiva reversão da deterioração das contas públicas. Há risco significativo de esse déficit ser ainda maior. A proposta da PEC 241 de limitar a expansão das despesas em termos reais, inclusive com saúde e educação, à inflação do ano anterior não será cumprida sem uma ampla reforma da Previdência Social.
Mesmo no cenário otimista, o Brasil registrará déficit primário nos próximos anos, com alta da dívida pública como percentual do PIB até o início da próxima década. Portanto, os indicadores fiscais continuarão frágeis, apesar da recente melhoria da confiança dos agentes econômicos.
Defendi neste espaço que, logo após sua posse, o governo em exercício propusesse ao Congresso medidas econômicas fortes. Essas propostas incluiriam uma profunda reforma da Previdência, o contingenciamento de despesas obrigatórias, a flexibilização da legislação trabalhista, a reversão de renúncias tributárias, o aumento de impostos e a adoção de um vasto programa de privatização e concessão de serviços públicos. Argumentei que era preciso acelerar o trâmite legislativo para que várias votações já estivessem em andamento neste momento. Isso daria maior sustentação à valorização recente dos ativos financeiros ao reforçar o comprometimento da atual administração com o ajuste fiscal.
O tempo para a construção de um ambiente mais favorável à retomada sustentável está acabando
Ao contrário dessa estratégia, o governo tem apoiado ou, até mesmo, capitaneado diversas decisões que contrariam a consolidação fiscal, como os reajustes de salários para a elite do funcionalismo público, a ampliação do Simples, a elevação do benefício do Bolsa Família acima da proposta pelo governo afastado, a não compensação de eventual déficit de entes regionais pelo governo central e a renegociação da dívida dos Estados com contrapartidas pouco restritivas. Os reajustes salariais para outras categorias do setor público continuam a se propagar, elevando ainda mais as já insustentáveis despesas fiscais.
Essas ações têm sido atribuídas pelo governo interino à necessidade de cumprimento de acordos firmados antes da sua posse. Entretanto, essa argumentação é frágil. Ao elevar as metas de déficit primário para 2016 e 2017 argumentando que a situação fiscal era bem mais desfavorável do que antes indicado, a administração atual tinha razão mais do que suficiente para reverter acordos firmados sob condições bem menos desafiadoras.
Ao contrário do que poderia ser esperado, essas decisões não geraram impacto negativo sobre os preços de mercado, possivelmente em virtude do cenário global mais favorável e da habilidade do governo de contrabalançar novas despesas com anúncios sobre a submissão de diversas reformas ao Congresso nos próximos meses. Todavia, essas promessas parecem cada vez mais difíceis de serem aprovadas por completo. Um exemplo dessa estratégia foi a divulgação recente de estudos sobre uma reforma da Previdência com idade mínima de 70 anos, unificação dos sistemas previdenciários para os setores público e privado e regra de transição que aumenta em 40% o prazo remanescente para aposentadoria.
A postergação do anúncio da maioria das medidas necessárias e as decisões que elevaram o déficit fiscal confirmam que o governo interino optou por evitar qualquer risco de reversão do impeachment. Nesse ambiente, a maioria dos participantes de mercado se conforma com as últimas decisões, devido a restrições políticas, e julga razoável que a submissão das propostas seja postergada para depois do desfecho do impeachment ou, até mesmo, das eleições municipais. Essa leitura tem sido suficiente para fortalecer o otimismo e manter intacto o voto de confiança concedido ao governo.
Pouco peso é atribuído ao fato de a maioria dos congressistas e a articulação política do governo não terem urgência para avançar com as propostas. Um exemplo é a demora na votação da DRU no Senado, medida pouco relevante, mas cuja aprovação na Câmara de Deputados foi interpretada como um forte apoio político ao governo.
A postergação da submissão de medidas ao Congresso para o período pós-eleitoral reduz o tempo hábil para a votação de um maior número de reformas e enfraquece a habilidade de se aprovarem ajustes mais amplos. É possível que a votação final da PEC 241 e da reforma da Previdência só ocorra, respectivamente, no início e no segundo trimestre de 2017. Além disso, quanto mais próximo das eleições de 2018 e das definições dos partidos políticos sobre coligações para as eleições presidenciais e estaduais, mais difícil será angariar apoio de 308 deputados e 49 senadores para aprovar reformas que imponham redução de direitos dos eleitores.
A convicção da maioria dos participantes de mercado é que, após a votação do impeachment e as eleições, serão encaminhadas as propostas que por ora são apenas promessas. A expectativa é de que o governo centrará todos os esforços nesse sentido. Assim, o benefício da dúvida e a alta dos preços dos ativos domésticos, em um contexto global favorável, ampliaram o tempo disponível, possivelmente até novembro, para o governo adotar uma política fiscal mais firme e, no primeiro momento, impopular, mas comprometida com a consolidação fiscal.
Infelizmente, o ambiente favorável pode estimular o governo e o Congresso a adotar ajustes mais graduais, que se mostrarão logo adiante aquém do requerido para reduzir os riscos de aprofundamento da crise fiscal. O passado recente demonstra que a percepção pode piorar repentinamente, por exemplo, com uma mudança no ambiente global. Nesse caso, o otimismo evapora; e, em algum momento, o benefício da dúvida expira.
O tempo para a construção de um ambiente mais favorável à retomada sustentável da atividade está contando ou, de outra forma, acabando. Ao fim, as promessas não comprarão mais tempo, e a crise pode retornar.
Nilson Teixeira, economista-chefe do Credit Suisse (Brasil), é Ph.D. em economia pela Universidade da Pensilvânia

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