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Perfil: Eduardo Cunha, uma trajetória com truculência e perseguições




Desde a época em que presidiu a Telerj, ex-deputado se vale do poder para pressionar

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Eduardo Cunha em 1999, quando era presidente da Cehab - Guilherme Pinto / Agência O Globo


RIO — Na decisão que levou Eduardo Cunha à cadeia nesta quarta-feira, o juiz Sérgio Moro destaca que o ex-parlamentar é tido como “alguém que se vale, com frequência, de métodos de intimidação”. Esse modo de agir pode ser novidade para a Operação Lava-Jato, mas não para quem já o conhece há mais tempo, como é o caso dos veteranos dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores Telefônicos do Rio de Janeiro. Eles tiveram de enfrentá-lo na mesa de negociações no governo Collor (1991-92), quando presidiu a Telerj.

Na época, Cunha, que se tornou, até bem pouco tempo, um dos políticos mais influentes do país, se negava sistematicamente a negociar a reposição das perdas salariais provocadas pelos planos Bresser e Verão. Como os telefônicos não arredaram o pé da pauta de negociações e organizaram uma greve, ele passou a publicar, na capa do jornal interno da telefônica, um selo, espécie de contagem regressiva, informando quanto tempo restava para acabar o mandato da diretoria do sindicato, a quem cabia o papel de representar os trabalhadores da Telerj na mesa de negociações.

Dali em diante, o sindicato passou a considerar Cunha o mais reacionário executivo que havia passado pela presidência da empresa. O político do PMDB, agora réu preso na Lava-Jato, havia chegado ao comando da Telerj por indicação do empresário Paulo Cesar Farias, o PC Farias, após atuar na campanha de Fernando Collor para presidente da República em 1989.

O mesmo estilo truculento apareceria em outros momentos da trajetória política de Cunha, alguns dos quais desconhecidos do público. Em 2001, logo após assumir a cadeira de deputado estadual pelo PPB, ele iniciou uma implacável perseguição ao jornalista (já falecido) Paulo Branco, de um boletim político chamado “Raio Xis-Rio”.

Tudo porque Branco havia contado que Cunha, até então suplente, ocupou a vaga do deputado José Amorim para escapar de eventuais sanções por ter se envolvido em fraudes na Companhia Estadual de Habitação (Cehab), que presidia. O jornalista divulgou que Cunha teria comprado o mandato. Em represália, Cunha processou o jornalista — numa estratégia de intimidação que logo se ampliaria a outros repórteres que o criticavam — e conseguiu condená-lo a pagar uma indenização de R$ 20 mil. Branco morreu em outubro de 2004, sem conseguir quitar a dívida, que foi transferida para a viúva. Com dificuldades financeiras, agravadas pela perda do marido, ela fez chegar ao deputado um apelo pelo fim da causa, mas Cunha não a perdoou. Exigiu o pagamento.

PRESSÃO EM EXAMINADOR DO DETRAN

O examinador de trânsito Antônio Antunes Coimbra, do Detran-RJ, foi outro que sentiu na pele os métodos de agir de Cunha. Depois de reprovar na prova de baliza uma das filhas do ex-deputado, Camilla Ditz da Cunha, em 5 de junho de 2008, porque a jovem de 18 anos entrara na vaga sem ligar a seta e saiu dela com o freio de mão puxado, Coimbra, irmão de Zico, ídolo do Flamengo, foi acusado por Cunha de tentar achacá-la.


O poder público foi implacável com Coimbra: submetido a uma sindicância interna, o examinador foi punido com 30 dias de suspensão, sem vencimentos, além do afastamento das provas. Até hoje, ele tenta anular punição na Justiça, alegando que nunca foram apresentadas as provas.

Moro, na decisão de ontem sobre a prisão preventiva, relata que Júlio Gerin de Almeida Camargo, um dos primeiros que revelou a participação de Cunha “no esquema criminoso da Petrobras”, afirmou em juízo que ocultou os fatos em seus primeiros depoimentos por medo das ameaças do então presidente da Câmara dos Deputados.

Cunha também usava aliados para intimidar suas vítimas. Um dos alvos foi o empresário Milton Schahin, do Grupo Schahin, que tinha uma disputa comercial com o suposto operador de propinas do político, Lúcio Bolonha Funaro, causada pelo rompimento da hidrelétrica de Apertadinho, que estava sendo construída em Rondônia. Em depoimento à Justiça, Milton narrou existência dos diversos requerimentos na Câmara dos Deputados com o intuito de prejudicar o grupo, além de uma reunião com a presença de Cunha para tratar das divergências existentes sobre o rompimento da barragem.

Uma das últimas tentativas de intimidação de Cunha aconteceu em julho deste ano, quando ele se defendia na Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) da Câmara e queria convencer os colegas de que as contas na Suíça não pertenciam a ele ou a qualquer membro de sua família, mas a um trust. Na época, ele disse que havia na sala da CCJ deputados sob investigação: “Hoje, sou eu. É o efeito Orloff. Amanhã, vocês”.

O estilo, desta vez, não funcionou. Cunha não apenas acabou tendo cassado o mandato de deputado federal, como o juiz federal Sérgio Moro desqualificou o argumento do trust. “Em princípio, o álibi de que as contas e os valores eram titularizados por trusts ou off-shore é bastante questionável, já que aparentam ser apenas empresas de papel, sem existência física ou real”.





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