Quando
estiverem esgotadas todas as consequências da Lava Jato e o Legislativo
brasileiro não estiver intimidado pela eventual descoberta de falcatruas no seu
próprio meio, inibindo sua capacidade de iniciativa, será o momento de se fazer
um balanço do sistema judiciário brasileiro e depurá-lo dos excessos cometidos.
Não há dúvida de que o balanço apontará fatos positivos, notadamente a
incriminação de criminosos de colarinho branco jamais alcançados pela Justiça
anteriormente. Mas há também fatos negativos.
O
principal deles terá sido o atropelamento do sistema judicial brasileiro. Por
algum caminho será necessário recuperar os princípios de habeas corpus,
presunção de inocência e devido processo legal, todos solenemente ignorados em
Curitiba. Também terá de ser disciplinado o instituto da delação premiada já
que nenhum país realmente democrático poderá aceitar como comportamento
corriqueiro da polícia ou da Justiça torturar psicologicamente presos na cadeia
para lhes arrancar confissões.
Talvez
fosse impraticável chegar aos resultados positivos da Lava Jato sem esses
expedientes extralegais. Isso se deveria, basicamente, à incompetência do
sistema policial brasileiro de reunir provas consistentes contra criminosos de
colarinho branco. Talvez a interferência norte-americana nesse processo, como
instrutores de promotores e policiais brasileiros, conforme ficou evidenciado,
tenha sido justamente a de treiná-los aqui para usar procedimentos de tortura
psicológica que seriam inaceitáveis nos Estados Unidos.
Vamos
pensar mais longe, porém. Algum dia, no futuro, nossos sistemas judicial e
criminal serão revistos e reorganizados por um Congresso sem medo da própria
incriminação. Para mim, além da reafirmação de princípios seculares da
democracia, como os mencionados acima, será importante introduzir ou reforçar
um princípio bem contemporâneo. Trata-se de contrabalançar o direito quase
absoluto do Ministério Público de acusar com o direito do cidadão de
contra-atacar com a figura da denunciação caluniosa.
É
importante assinalar que o Direito Civil, historicamente, é um direito do
cidadão contra a força desproporcional do Estado. Entre nós, ao contrário, a
força do Estado foi reforçada pela Constituição de 88 que conferiu ao
Ministério Público total liberdade de ação. Este último, além disso, por um
expediente corporativo, elege os seus próprios chefes literalmente à margem do
poder eleito, o Executivo. Procuradores e promotores tornaram-se, assim, uma
corporação autônoma, não eleita. Podem denunciar todos e tudo, inclusive
falsamente. A isso chamam democracia!
Outra
aberração é a do Juízo de Instrução, na forma como vem sendo exercido pelo juiz
Sérgio Moro. Normalmente, entendemos o juiz como um árbitro imparcial entre a
acusação e a defesa. O que temos visto é uma situação em que polícia,
procuradores e juiz atuam todos do mesmo lado de forma inteiramente assimétrica
em relação ao acusado. É claro que isso é uma violação de direitos básicos de
cidadania. O Estado é, em si mesmo, forte demais na relação com o acusado.
Juntar aquelas três instâncias é ditadura judicial, conforme reclamou com razão
o ex-presidente José Sarney.
Fonte:
brasil247
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