Sempre evitei reproduzir postagens do tipo “fulano na cadeia” ou “fulano é inocente” embora, a tentação de tomar partido fosse grande. Eu sempre defendi a posição de que “o fulano deve ser investigado, julgado e se houver provas concretas que seja condenado”. Mas chegamos a um momento em que a guerra de narrativas nos obriga a nos posicionar, sob pena do obscuro e infame se impor à dúvida ou mesmo à “verdade”. Neste ponto onde chegamos, daqui da nossa janela virtual e também a partir do que muitos juristas respeitados disseram, ninguém tem elementos concretos para afirmar que Lula é inocente e, muito menos, que ele é culpado. A despeito das narrativas interessadas se pugnarem para um ou outro lado, esse fato se impõe, e implicaria necessariamente na aceitação da sua inocência, caso Lula estivesse diante de um tribunal realmente isento e honesto.
Quando um problema está contaminado pelo interesse pessoal, de grupos e turbinado pelos interesses econômicos e os da própria mídia, é quase impossível estabelecer premissas comuns que possam servir de parâmetro para um ou outro lado.
Então, temos que procurar outros caminhos de entendimento que estejam relacionados com o problema específico, sejam mais abrangentes que ele e o coloquem numa perspectiva mais privilegiada de observação. Quais são os fatos gerais incontornáveis que temos para montar essa perspectiva?
1) Uma crise mundial a partir de 2008;
2) O Brasil não entrou no turbilhão da crise, pelo menos até 2014;
3) O Brasil possuía empresas privadas que ganhavam mercado no mundo;
4) Contrariando o interesse do Banco Mundial, do FMI e dos bancos privados do cartel que os compõem, o BNDES financiava várias economias no mundo;
5) A criação dos Brics;
Nesse ponto vale ressaltar que o sonho dos rentistas é emprestar para países, depois para empresas sólidas e por último para indivíduos ricos. O monopólio do dinheiro das transações globais foi estabelecido em 1944 no “acordo” de Bretton Woods, quando se internacionalizou sobre as nações, o estelionato praticado pelos bancos controladores do Fed, do BM e do FMI. É importante ressaltar, que o processo de endividamento dos países a partir de então, criava um montante de dinheiro fantasma 10 vezes maior que o dinheiro real, que retroalimentava crescentemente a pirâmide financeira do BM e do FMI.
Esse dinheiro fantasma foi primeiramente usado para a reconstrução da Europa, financiar o apartheid sionista na Palestina e a indústria bélica. Grande parte desta conta a ser paga foi empurrada goela abaixo nos outros países, via monopólio de Bretton Woods, que foram obrigados a se endividar a fim de manter essa pirâmide em crescente expansão. Para isso, além de se endividar, esses países tiveram que submeter a sua economia, e portanto o controle de suas políticas e seus bancos centrais, aos interesses desse cartel privado. É em função desse monopólio do dinheiro e de sua estratégia de dominação global que governos democráticos foram derrubados, ditaduras implantadas e invasões e guerras locais foram travadas, dependendo do nível de resistência que tais países ofereceram a essa agenda.
Esse parágrafo é só para explicar que instituições financeiras, que não fazem parte daquele cartel e dos bancos privados que o compõe, que se atrevem a financiar o crescimento de países, dependendo da extensão de sua atuação, estão, portanto, desafiando o monopólio estabelecido pós Bretton Woods. O monopólio do dinheiro é a chave para a estratégia do cartel do rentismo internacional. Com mais exemplos, podemos constatar os problemas que Sadam Hussein começou a ter, quando passou a comercializar o petróleo em outras moedas, que não o dólar. A formação dos Brics também não foi muito bem recebida pelo cartel, tendo seus membros sido envolvidos desde então em esforços contrários ao seu estabelecimento: pressão sobre a China em relação à Coréia do Norte, sanções econômicas à Rússia, fomento de crise e golpe no Brasil. Além da desestabilização de países naturalmente aderentes a este polo político-econômico.
6) Mudança na jurisprudência em relação ao “in dubio pro reu” a partir da instância jurídica máxima. Falsificou-se, deturpou-se, um argumento jurídico utilizado em tempos de excessão, de crimes contra a humanidade, para fins estritamente políticos: o caricato “domínio do fato” foi desenhado estritamente para se iniciar um processo articulado externamente, tudo leva a crer que, mais tarde, culminaria numa crise social, política e institucional;
7) Golpes preparatórios em Honduras e Paraguai, foram os balões de ensaio do que ocorreu no Brasil, do que tentaram no Equador e Venezuela e estava já montado na Argentina, caso Macri não vencesse;
8) A operação Lava Jato se concentrou no governo e aliados que pudessem incriminá-lo, tomando o cuidado de desviar rotas e não envolver quem pudesse implodir o recorte politicamente selecionado e trazer suspeição a respeito dessa articulação entre interesses políticos afins. O caso Cunha e Aécio demonstram claramente isso. No primeiro caso, há uma grande suspeita de um acordo para livrar a mulher de Cunha, em troca de seu silêncio que envolveria mais de 100 políticos e dezenas de magistrados, que investigados, implodiriam o congresso e o judiciário corruptos. O segundo caso é uma verdadeira confissão de culpa por parte do STF, da Força Tarefa, Moro e do MP. É de imensa e definitiva importância para comprovar a participação do judiciário na articulação, notar que tanto no caso de Cunha quanto no de Aécio as informações que os levaram a ser investigados vieram de fora. O que faziam a PF e o MP a respeito? Bem, o Aécio está contando com a mãozinha salvadora de magistrados conscientes da importância de blindar os tucanos sob pena deles mesmos serem desmascarados. Não temos nenhum motivo para pensar que não se trata de uma máfia se auto protegendo;
9) A venda do pré sal a preço de menos de 1% do seu valor e a força tarefa dando uma mãozinha indispensável para que a Petrobrás pague bilhões para apostadores de bolsa de valores em Nova York. A pergunta que fica: e os apostadores daqui também terão o mesmo direito? Parece que o nosso judiciário não tem o mesmo empenho em aparecer aqui, em “se mostrar útil”. Será a recompensa nos EUA mais atraente?
10) E voltamos ao julgamento do Lula. Sua controversa condenação por Moron e depois pelo TRE-4 (desculpem, não resisti).
Esses fatos se encaixam? De que forma? Ou seriam todos eles desconectados e aleatórios?
Eu não posso afirmar que Lula é inocente. Mas posso com tranqüilidade dizer que num julgamento estritamente técnico ele seria absolvido.
Sem os malabarismos jurídicos inventados pelo lamentável e desnecessário Joaquim Barbosa, seguido pelos seus pares, aliviados eles mesmos de não terem que fazer tal monstruosidade jurídica, sem a parcialidade explícita de Moro (ou seria pura ignorância?) diante do tosco e fantasioso trabalho de estagiários do MP, o Brasil sequer entraria em crise e portanto não haveria clima para golpes.
Podemos também afirmar sem medo de errar que, “pelo conjunto da obra” desvelamos um judiciário majoritariamente fraco, corrupto e incompetente em sua finalidade.
E o melhor, ninguém tem mais a menor dúvida de que em sua maioria os corruptos que burlam astuciosamente as leis para receberem acima do teto, têm o desprezo da esmagadora maioria da população e que logo terão que, de uma forma ou de outra, bater em retirada. Agradeçam ao Barbosa, ao Moro e sua trupe entusiasmada e aos 3 do TRE-4: vocês agora são a bola da vez.
Sérgio Moro veio com a explicação para o recebimento indevido – sim, indevido, porque não se trata de indenização por gasto em moradia – do auxílio que ele recebe para morar em apartamento próprio.
— O auxílio-moradia é pago indistintamente a todos os magistrados e, embora discutível, compensa a falta de reajuste dos vencimentos desde 1 de janeiro de 2015 e que, pela lei, deveriam ser anualmente reajustados — disse ele a O Globo.
Modus in rebus, excelência, como se diz no fórum, citando os versos do romano Horácio em suas Sátiras. Moderação nas coisas.
Primeiro, o auxílio não é “pago indistintamente a todos os magistrados”, mas apenas aos que o requerem, declarando que não possuem cônjuge com o mesmo benefício e comprometendo-se a informar o tribunal se isso vier a ocorrer. Está bem escritinho lá na Resolução 199 do Conselho Nacional de Justiça.
Não lhe caiu na conta, portanto: o senhor o pediu e pediu sabendo que não merece receber indenização por moradia por ter moradia própria e, portanto, não ter despesa locatícia com ela.
Se o fato de ficar sem reajuste fosse motivo para pagar vantagens indevidas, os professores, os médicos, os humildes faxineiros do serviço público também deveriam recebê-los, porque muitos estão sem reajuste faz tempo.
E na iniciativa privada, se o patrão não dá aumento, será que podemos pegar do caixa da firma o que achamos ser justo?
Quem sabe devêssemos dizer: “trabalhadores explorados, pegai o que acham merecer”
Recorde-se, Dr. Moro, que o caso dos senhores é julgado por seus pares, igualmente potenciais beneficiários da mesma vantagem.
Não, Doutor, essa vantagem não é moral, não é legal.
É indevida, porque não está prevista, como se demonstrou aqui, em lei alguma, mas apenas por uma decisão de um ministro do Supremo que torceu a disposição excepcional da Lei Orgânica da Magistratura para concluir não só que todo e qualquer juiz teria direito a uma “residência oficial” quanto para entender como aluguel ou hospedagem a moradia em imóvel próprio.
O senhor, que condenou Lula por uma vantagem indevida que ele não recebeu, ou da qual há qualquer prova de que solicitou, recebe vantagem que sabe ser indevida e que, ao contrário do ex-presidente, solicitou expressamente.
A sua justificativa é tão pífia quanto aquela do ex-presidente do TJ-SP, que declarou que, sem reajuste, os juízes precisavam do auxílio para comprar ternos, porque “não se pode toda hora ir a Miami”. O senhor não lembra? Está aqui.
Os versos do poeta Horácio, excelência, continua: “sunt certi denique fines, quos ultra citraque nequit consistere rectum”.Livremente, “há certos limites dos quais não se pode passar sem perder a retidão.”
Seria bom que o senhor e seus colegas lessem o velho poeta, que nesta sátira ataca a ambição, perguntando se te basta um copo, porque tentar beber o rio inteiro?
E o copo dos juízes, neste Brasil sedento, já é um barril.
Fonte: apostagem
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