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PRISÃO, por Dr. James Walker Júnior



James Walker Junior, no Facebook.


O bom debate eleva e frutifica.

Em respeito aos colegas que me solicitaram, assevero:

O cárcere é um estado de exceção ao ser humano.

Naturalmente, o homem nasce livre e assim deve permanecer.

Mas evidente, que há transgressões e, por nossa absoluta incompetência em encontrar outras alternativas, segue o aprisionamento humano como principal medida punitiva.

Entretanto, nesta quadra, existe uma superutilização da prisão, que tem como corolário um hiperencarceramento, tendente a criar situações ainda mais vitimizadoras da sociedade, que muitos não conseguem alcançar.

Primeiro temos um número próximo a 700 mil presos no Brasil, sendo 40% desse contingente de presos provisórios, ou seja, sem decisão transitada.

Em mais de 30% desses casos, ao término do processo (trânsito em julgado) esses indivíduos presos provisoriamente, por longos períodos, são condenados a penas diversas da prisão, mas foram ceifados em suas liberdades, porque o estado, indiferente à vida e liberdade alheias, permite que jovens agentes públicos, transbordando testosterona e moldados pela cultura Yankee de Anjos da Lei, se realizem em suas existências justiceiras e solipsistas com a prisão alheia.

Mas não é só isso!

Quem deve ser preso?

No Brasil quem não paga pensão, quem não paga imposto, quem faz gato de luz, quem rouba, quem dirige depois de ingerir 1/4 de copo de cerveja, quem trafica drogas, quem da palmada no filho, quem bate na mulher ou no próximo, quem xinga o gay, quem ofende o padre, pai de santo ou pastor, quem pratica corrupção, quem mata, quem não mata, acho mesmo que, ao final desse texto, quem lê e quem escreve também deverá seguir ao cárcere.

Por que?

Porque adotaram a prisão e, antes dela, a utilização anômala do Direito Penal, como uma espécie de Bombril político-jurídico.

A prisão tem mil e uma (i)nutilidades!

Para tudo que não der certo, temos a prisão.

O mendigo, os negros, os pobres, os indesejáveis, são os clientes de sempre.

Nestes tempos, para satisfação social e legitimação do processo de aprisionamento em massa, prende-se meia dúzia de ricos e/ou políticos, no mais das vezes seletivamente, conquanto a continuidade do processo de exercício anômalo do poder de encarcerar dependa do apoio da opinião pública, sempre pautada pela opinião publicada.

Não há razão para pessoas civilizadas adotarem o encarceramento alheio como forma de "tratar" questões sociais, crimes sem sangue ou extrema violência, quando não evidenciado, de forma inexorável, o absoluto periculum libertatis.

Falei de aprisionamento por questões sociais, para não avançar no debate do vergonhoso jogo de poder encarcerador a partir de questões de saúde pública, como no caso das drogas, sufragando uma guerra sangrenta e despropositada.

A sociedade está pautada em um moralismo de classes, que excluiu seus "desiguais", mas como não inventaram mecanismos de abdução, seguimos prendendo e jogando para o degradante "debaixo do tapete carcerário" o dejeto social das elites, numa espécie de assepsia dos invisíveis.

Será mesmo que temos que prender como seguimos fazendo?

Os resultados revelaram alguma melhora?

Não sou abolicionista, absolutamente, mas por favor, se pintar algum "bolsonariano" com discurso de "leve pra casa", por favor, me poupe, só por hoje, pois passei a manhã inteira dentro de um presídio em Curitiba.

Prisão é a última fronteira, a medida extrema, a exceção que no Brasil virou regra, por força da nossa própria incompetência.

Mas entre admitirmos a nossa incompetência para lidar com a questão, e a opção de fazer mais do mesmo, ou seja, continuarmos prendendo favelados no atacado, essa ultima opção é muito mais fácil e cômoda, contanto que a clientela seja aquela e não os seus.

Trata-se de uma das mais complexas questões da criminologia, tratar do encarceramento, não tenho qualquer pretensão de me investir de jurisconsulto de Facebook, mas finalizo com uma reflexão.

O professor do ensino público custa 3 mil/mês ao estado, o preso 4.200 (só falta você achar que a culpa dessa conta também é do gozador pervertido do ônibus), os telejornais são, em regra, o horário mais nobre da televisão, leia-se, venda de propaganda, que depende da atratividade das matérias veiculadas, coincidentemente os telejornais utilizam 70% de seus horários com matérias da área criminal.

Ou seja:
Crime é Agro
Crime é Tech
Crime é Pop

Vende mais que qualquer outro produto, paga os salários de todos os promotores e juízes, apresentadores de telejornais e programas tipo datena, os meus ganhos também, alimenta indústrias inteiras de roubos e furtos, que realimenta indústrias de seguros, que, por sua vez, dá emprego a mais de 70 mil policiais entre civis e militares no RJ.

Que enriquece rei de quentinhas e seus sócios políticos, que fomenta a movimentação de trilhões em armas e munições, de parte a parte (bandido e policia compram dos mesmos fabricantes).

Mas para tudo isso existir, para toda essa riqueza girar, para você classe média ficar "satisfeitinho", tem que ter matéria prima a suprir essa produção.

E nesta indústria a matéria prima é carne humana, então, se o encarceramento não ofende a moralidade média, de uma classe média que defende seu patrimônio também depositando carne humana em masmorras, seguimos entupindo os depósitos de corpos com aquela "cambada" que não serve para nada, os indesejáveis.

Enquanto for com eles está tudo certo.

Mas quem prende, sacana e perverso que é, pode te alcançar leitor, basta querer, pois no momento, o único super herói de plantão é o criminalista, e está fraquinho por conta da sua criptonita discriminatória da nossa classe, já que quem defende bandido... 

Sua sanha prisional persiste até o seu parente ser preso, o filhinho da "autoridade", aí sim, tudo muda, então não existe mais prisão por "princípio", ressurge sua moral meio mais ou menos, mais ou menos.

Poderia falar aqui a vida toda, mas o avião já saiu de Curitiba, chegou ao Rio e nem vi.

Deve ter um monte de gente me xingando, "bandido bom é bandido morto", se "ele defende bandido também é bandido", etc, mas o fato é que, de todas as liberdades que tentamos diariamente, a que eu tenho consciência que jamais alcançarei (por liminar ou no mérito), é a façanha de libertar certa parcela da sociedade de sua hipocrisia, seu preconceito, sua perversidade e seu solipsismo.

Que bom que fui e voltei a Curitiba e continuo solto!


Doutor James Walker Júnior é Presidente da ABRACRIM - RJ.

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