Jornal GGN - O procurador que coordena a força-tarefa da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol, defendeu que no pós-Lava Jato as "reformas estruturais" que o Brasil precisa são modificar os direitos dos réus - a que ele denominou de "hipergarantismo" - e aumentar os "direitos da sociedade", traduzindo-se em maior punição e, inclusive, a valorização de provas ilícitas.
Ao ser questionado pelo jornalista Luiz Maklouf Carvalho, do Estado de S. Paulo, que o recebimento de provas ilícitas não deve prevalecer em relação ao da presunção de inocência, sendo que este último é previsto na Constituição e o primeiro não, Dallagnol respondeu que "isso não faz sentido" em sua "perspectiva".
E que, apesar de o Legislativo, como Poder independente e autônomo, ter decidido assim dentro do que traduz a nossa democracia, a seu ver isso "deve mudar". "A boa fé é algo inerente ao sistema de provas ilícitas, que o Brasil importou dos Estados Unidos. Só que quando a gente importou esse sistema, só importamos a metade que protege o réu. A outra metade, que protege a sociedade, a gente abandona", disse Dallagnol.
Para o procurador, o que ocorre hoje é um "hipergarantismo", que consolida princípios de ampla defesa e presunção da inocência da Constituição de 1988, e a seu ver é negativo. Segundo ele, foi essa "interpretação" que permitiu proteger os crimes de colarinho branco.
"Não é a Constituição que tem que mudar essa equação – e não o dr. Deltan, que de resto poderia ter se candidato a deputado ou senador, e ir defender as dez medidas lá no Congresso, em vez de ficar correndo atrás de assinaturas?", perguntou o jornalista.
"Ótimo! Eu gosto de ouvir a divergência, porque ela é saudável e ajuda a construir um debate que enriquece o resultado. O que está colocado, com esse argumento, é medo de quem já passou por uma ditadura, o medo de que o Estado se exceda. A minha geração é uma geração que cresceu sem ditadura, vendo abusos de governantes praticando mandos e desmandos sem qualquer punição. O que a gente prega é altamente compatível, existe e funciona nas democracias do mundo", foi a resposta de Dallagnol.
Ao fim da entrevista, concedida pelo investigador, o repórter aponta que essa "relativização" da Carta Magna contra os direitos fundamentais de defesa, denominados de "in dúbio pro reu", é "muito perigosa em um sistema democrático". Deltan respondeu com um exemplo que fugiu à pergunta.
"Eu aprendi nos Estados Unidos um argumento que se chama slippery slope . É o argumento da ladeira escorregadia: “se você encosta em mim, daqui a pouco me dá um tapa e daqui a pouco um tiro na cabeça”. É um argumento tem por base o medo, que é uma emoção altamente poderosa. Mas a grande questão é: esse slippery slope procede? Será que não há barreiras entre esse tocar na pele e o tiro na cabeça? Nesse caso não existe. Estamos propondo medidas que já existem nas democracias civilizadas...".
Em seguida, o jornalista lembrou que, ao contrário desse argumento importado dos EUA, o "in dubio pro reu" está na Constituição. O procurador concluiu entendendo que, na verdade, não se trata de ir contra a Carta Magna, mas modificar algumas de suas interpretações, que seriam possíveis.
Leia a entrevista completa aqui.
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