Brasil247
Estava na Casa Civil da Presidência da República quando em julho de 2013 o Brasil foi às ruas reivindicar melhorias nas políticas públicas, transporte urbano gratuito, mais saúde e educação.
Acompanhei as medidas tomadas pela presidenta Dilma, que dentre todos os governantes foi praticamente a única a ter coragem para dialogar com aquele movimento. Isso, com certeza, trouxe grande responsabilidade para ela, inclusive o desgaste político que começou a se acentuar.
Entre as ações apresentadas, implantou-se o Mais Médicos, foram contratadas e construídas mais de seis mil creches, o FIES foi ampliado, desonerou-se os tributos do sistema de transporte coletivo para impedir o aumento das tarifas, mais recursos foram colocados para obras de infraestrutura para o transporte público, ampliou-se o Minha Casa, Minha Vida.
Passado o tempo, a população colocou em sua pauta o combate à corrupção e apoio à operação Lava Jato. A direita do país, sua elite, fortemente apoiados pela imprensa, aproveitaram-se da situação para criar clima e concretizar um processo de impeachment sem base constitucional, afastando a presidenta legitimamente eleita do poder.
Além de tentar “conter a sangria” das investigações, como dito e repetido em gravações de senadores aliados do governo interino, o outro motivo para o impeachment foi alterar o programa de governo e reduzir as políticas públicas em benefício de despesas financeiras e do mercado, o que é flagrantemente contrário ao movimento reivindicatório de 2013.
É isso, exatamente, o que faz a Proposta de Emenda Constitucional que Michel Temer mandou ao Congresso Nacional nesta semana, estabelecendo teto de gastos no orçamento da União, que não poderão crescer, de um ano para outro, mais do que a inflação do período.
Nunca é demais lembrar que o efeito prático dessa proposta, se fosse aplicada dos anos de 2006 a 2015 para as ações de Saúde, R$ 178 bilhões teriam deixado de ser investidos. No caso da Educação a perda seria de R$ 321,3 bilhões. Isso sem falar das medidas que virão para desestruturar o sistema previdenciário e acabar com os reajustes reais do salário mínimo.
A população já começou a perceber o que está acontecendo e volta às ruas protestar, não só por conta das perdas objetivas que virão, mas também por direitos e avanços conquistados que também estão na pauta dos retrocessos.
O Brasil que está protestando contra a cultura do estupro, contra o enfraquecimento das escolas públicas, contra os homicídios dos jovens negros e pobres “representa a grande potência criativa deste momento”, como escreveu a escritora Eliane Brum, recentemente. E continua ela… “É importante perceber, porém, que há ganhos que não retrocedem. A primeira geração de jovens negros que chegou à universidade não vai deixar de pressionar pela ampliação dos acessos. Assim como as mulheres que se empoderaram ao receber o Bolsa Família já se tornaram outras. É fundamental identificar onde está o movimento. E onde está a paralisia. Ou mesmo o retrocesso. Descolados do Brasil que se move, nem o governo nem o Congresso têm resposta. Em parte, porque sequer entendem o que dizem os manifestantes que ocuparam as ruas.”
Fazemos no nosso cotidiano de governo e parlamento um debate mudo a maioria do povo brasileiro, sem nos dar conta que não temos, assim, possibilidade de representá-lo.
A pauta real, do cotidiano das pessoas, tem de voltar ao centro dos debates. Respeito, dignidade, acesso a políticas públicas, mais saúde, educação, transporte de qualidade. É isso que concretiza a democracia pela qual tanto lutamos ultimamente. Queremos o fim desse golpe, o “fora Temer”, fim dos retrocessos, garantia dos direitos. Mas isso só será possível, novamente, quando a política estiver perto do povo. Para isso, ele precisa decidir!
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