Raimundo Lira (esq) e Antonio Anastasia (dir) na comissão do impeachment (Reuters) |
por Alexandre Morais da Rosa*, Empório do Direito
Erro
do parecer apresentado pelo senador Antonio Anastasia favorável ao impeachment
de Dilma Rousseff pode anular o processo no Senado Federal
O
parecer apresentado pelo Senador Antonio Anastasia, do PSDB, encaminhando para
o recebimento da acusação da Presidente Dilma Roussef, padece de um erro de
trajeto que pode torná-lo imprestável, justamente porque:
1)
Confunde julgamento administrativo com penal, convenientemente abraçando-se com
a tese da analogia, da interpretação ampliada, da simples conveniência e
oportunidade, buscando escapar da ausência – flagrante – de conduta típica.
Invoca a Lei de Introdução ao Código Penal, especificamente na ausência de
pena, mas esquece-se que o Supremo Tribunal Federal já declarou constitucional,
pelo menos em tese, o art. 28 da Lei 11.343/06 (uso de drogas) em que não há
sanção (reclusão ou detenção), embora discuta a legitimidade da criminalização
(RE 635.659), bem assim que as disposições inseridas na Lei 1.079/50, deram-se pela
Lei 10.28/2000, que trouxe alterações “penais”, expressamente indicando as
administrativas no art. 5o (confira aqui).
2)
Com isso, o relator (aqui) deixou de reconhecer as garantias penais – Não há
crime sem lei anterior que a defina. Não há pena sem prévia cominação legal
(Código Penal, art. 1º); Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior
deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos
penais da sentença condenatória (Código Penal, art. 2º).
3)
Se assim for, desnecessária seria a existência de tipicidade – descrição de
conduta vedada em lei – para que o processo de impeachment possa ir adiante.
Tanto assim, aliás, que o pedido inicial parte justamente da verificação de
violação à regra de conduta.
4)
Conforme já deixei assentado (aqui), o impeachment: É julgamento de Direito
Penal e, portanto, munido das garantias do devido processo legal, dentre eles o
da correlação entre acusação e decisão[1]. A decisão do Congresso deve guardar
congruência entre a acusação e a decisão[2]. Não se trata de juízo final, em
que se poderia julgar a presidente como pessoa, mas sim pela conduta imputada.
Assim, distante das questões de conveniência e oportunismo[3].
5)
Logo, se o julgamento escapa das garantias penais, por mecanismos retóricos,
cabe ao Supremo Tribunal Federal, mais uma vez, garantir a autonomia e eficácia
do Direito Penal, especialmente da taxatividade e legalidade.
6)
Independentemente da coloração partidária, então, a prevalecer a mesma lógica,
um Ministro do Supremo Tribunal Federal, por exemplo, poderia ser cassado pela
conveniência e oportunidade do parlamento, sem a realização de conduta típica?
7)
Vamos aguardar a manifestação do Supremo Tribunal Federal.
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Notas
e Referências
[1] TAVARES, Juarez; PRADO, Geraldo. O Direito Penal e o Processo Penal no Estado
de Direito: Análise de Casos. Florianópolis: Empório do Direito, 2016, p.
11-66, especialmente “O processo de impeachment no Direito brasileiro”.
[2] NASSIF, Aramis. Sentença Penal: o desvendar de Themis. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2005; BISSOLI FILHO, Francisco. Linguagem e Criminalização. Curitiba:
Juruá, 2011; VIEIRA LUIZ, Fernando. Teoria da Decisão Judicial: dos paradigmas
de Ricardo Lorenzetti à resposta adequada à Constituição de Lenio Streck. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2013.
[3] BAHIA, Alexandre Gustavo Melo Franco de Moraes; SILVA, Diogo Bacha e; CATTONI
DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. O Impeachment e o Supremo Tribunal Federal:
História e Teoria Constitucional Brasileira. Florianópolis: Empório do Direito,
2016.
*Alexandre
Morais da Rosa é Professor de Processo Penal da UFSC e do Curso de Direito da
UNIVALI-SC (mestrado e doutorado). Doutor em Direito (UFPR). Membro do Núcleo
de Direito e Psicanálise da UFPR. Juiz de Direito (TJSC).
Fonte:
pragmatismopolitico
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