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Pedido de renúncia é anúncio de confronto



Expresso num absurdo editorial da Folha de S. Paulo, o esforço dos adversários do governo para forçar Dilma Rousseff a pedir a renúncia do mandato presidencial possui dois significados.

O primeiro é jurídico. Equivale ao reconhecimento definitivo da fraqueza real do pedido de impeachment em discussão na Câmara, formulado com argumentos risíveis e desmascarado perante uma parcela crescente de brasileiros como uma constrangedora tentativa de golpe de Estado. 

O segundo significado é político. Na conjuntura atual, um pedido de renúncia equivale a uma perversão. Não é apresentado como aquilo que é -- uma decisão unilateral e voluntária de um ocupante de cargo público, seja um mandato de vereador no interior de São Paulo, seja a presidência da República -- mas uma exigência dos adversários. Um ato contrário à vontade que Dilma tem manifestado de forma clara e firme. 

Estamos falando de uma espécie de suicídio induzido por auto envenenamento, que todo aluno de curso médio aprende quando estuda a Grécia antiga, uma estranha democracia apoiada no trabalho escravo, onde Sócrates foi forçado a ingerir cicuta como punição por "corromper" a juventude. Pelo ritual, os verdadeiros criminosos escondiam sua culpa.

Falar em renúncia, no Brasil de 2016, é demonstrar disposição de confronto e perspectiva de enfrentamento. 

Implica na tentativa de conduzir a luta política muito além dos limites razoáveis, aqueles que envolvem o respeito e as regras da democracia e da soberania popular. 

Não estamos falando do confronto de ideias, do debate de divergências. Não é possível negar a necessidade de construção de um pacto político capaz de apontar uma saída para a crise do país. A mensagem de quem pede -- na verdade, exige -- a renúncia é: mesmo que a oposição seja incapaz de reunir os 342 votos necessários para abrir uma investigação contra a presidente na Câmara, não haverá trégua nem acordo.

Entramos na fase além do Estado Democrático de Direito. Com apoio da mídia, da polícia, do judiciário, os adversários do governo, vencidos em quatro eleições consecutivas, decidiram dar mais um passo na política de vale-tudo. Nós sabemos muito bem o que isso quer dizer. 

Equivale a submissão do conjunto do sistema político a uma força que está muito além da soberania popular. Sua origem é um poder de classe,de natureza histórica, que não aceita ser desafiado pela regras que todos estão condenados a respeitar para preservar o regime democrático. Neste universo, não há leis e procedimentos que todos devam aceitar e cumprir, rem nome de valores que constroem um bem maior, que é uma nação soberana, onde a Constituição vale para cada um e para todos. Nada disso. Estamos falando de patrões de republiqueta. 

O comportamento destrutivo desses personagens que se imaginam acima do Bem e do Mal explica o esforço permanente -- um ano e seis meses -- para impedir o governo de funcionar, mobilizando todas suas forças na direção da crise, do impasse e da paralisia, de modo implacável e sem descanso. Vale até destruir a 8a. economia do mundo, quebrar uma força que se tornou motivo de aplauso e respeito. A necessidade de recuperar o poder político ganhou prioridade sobre todas as coisas.

Cabe reconhecer, como óbvio, que o próprio governo tem uma parcela inegável de responsabilidade pelos impasses em que o país se encontra. Não dá para negar nem para discutir.

Com mandato até 2018, porém, o governo não pode ser impedido, porém, de exercer o direito legítimo de recompor suas próprias forças e buscar uma saída, numa situação na qual enfrenta uma articulada conspiração das elites que governam o país desde as caravelas de Cabral. São golpes sucessivos aplicados por farrapos morais que só lhe reservam ataques, infâmia e gestos de covardia.

Esta razão anti democrática está na origem de uma operação coordenada e multidisciplinar, pois envolve o Judiciário, o Congresso e especialmente a mídia grande, destinada a cassar os direitos políticos de Luiz Inácio Lula da Silva, que, pouco a pouco, começa a ser colocado numa posição que nos tempos da ditadura militar era chamada de semi legalidade.

Nessa condição, a pessoa até consegue encontrar os amigos, trocar ideias e manifestar suas opiniões na esfera privada. Em voz baixa, de preferência. Mas não tem o direito de travar seu combate no espaço público, quando propostas e soluções podem adquirir força material e influir nas decisões do Estado. 

Alvo previsível da Lava Jato desde que a operação foi iniciada, com base no grampo de um assessor do PP e seu advogado -- gravação de caráter ilegal, pois envolve a comunicação entre cliente e seu defensor -- do ponto de vista dos fatos conhecidos e provados as intermináveis investigações sobre Lula equivalem a uma atestado de inocência.

O mesmo se pode dizer sobre o caso Celso Daniel. As hipóteses de investigação que tentaram envolver membros do Partido dos Trabalhadores num crime terrível foram derrubadas em três inquéritos policiais, produzidos por equipes diferentes, em épocas diversas. Simplesmente não apareceram fatos nem provas. Conduzidas ao Supremo Tribunal Federal, foram rejeitadas duas vezes. Numa delas, condenou-se o "denuncismo", termo que dá uma ideia do caráter irresponsável da acusação. Em outra, configurou-se cerceamento da defesa -- aquela prática pela qual não se respeita o princípio segundo o qual todos são inocentes até que se prove o contrário.

Temos hoje um caso vergonhosamente óbvio de perseguição política a Lula, destinada a produzir factóides negativos contra uma pessoa que não se consegue acusar com um mínimo de credibilidade. O plano real é tentar atingir a memória deixada pelo mais aplaudido dos presidentes brasileiros. Não é um comportamento novo, diga-se. A novidade é a urgência. Pois o principal instrumento para L Lula defender-se reside na consciência da população, como ficou claro pela reação nacional a condução coercitiva para prestar depoimento a Polícia Federal.

Até há pouco acreditava-se, com a ingenuidade típica de quem não consegue enxergar a falta de escrúpulos presente nos planos adversários, que o massacre a Lula teria 2018 como horizonte. Era um jogo sujo, mas travado dentro das regras de um país com democracia estável, leis respeitadas, no qual um candidato com sua imensa representatividade e nenhuma culpa demonstrada poderia exercer o direito de candidatar-se na próxima eleição. Nada disso.

Os patrões de republiqueta querem que morra agora. Têm pressa. Estão aflitos. Com todas as cartas marcadas na manga, têm certeza da própria impunidade e não temem cometer aquilo que, sabemos todos, é um crime contra a honra e contra a história. Aceitam que Lula seja um meio ministro. Ou um meio cidadão. Não pode ser um brasileiro como os demais 200 milhões.

Não querem deixar passar aquilo que os cientistas políticos chamam de momentum. Até porque ele está passando mesmo. Basta andar na rua e se emocionar com lições universais de cidadania e democracia. Basta rir das desculpas de Lobão. 

Esta é a questão real.


Fonte: 247

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