Gilmar
Mendes prejulgou a causa, tendo dado entrevista à imprensa. Se Lula e Dilma
caírem, cairá junto com eles a democracia e o estado de direito.
naovaitergolpe.org
Recebemos
vários pedidos de avaliação da decisão do Gilmar Mendes sustando a nomeação de
Lula como Ministro-Chefe da Casa Civil, sob o argumento de que isso foi destinado
a criar blindagem, em razão da prerrogativa de foro de que dispõem Ministros de
Estado.
Em
conversas com nossxs colaboradorxs advogadxs e diálogo com outrxs
especialistas, entendemos por bem consolidar os seguintes pontos:
1.
Não há, nos audios, nenhuma declaração expressa de Lula ou Dilma no sentido de
que a nomeação se dá com esse propósito. Quando muito há ilação a este respeito
no diálogo sobre a assinatura do termo de posse (como também há várias ocasiões
em que, instado por terceiros a aceitar o cargo para escapar de Moro, Lula
rejeita expressamente essa possibilidade). Trata-se, portanto, de fato que
demandaria alguma dilação probatória, sendo, por isso, impossível invocá-lo
como razão de decidir no âmbito de Mandado de Segurança (sem falar que é
questionável a tese de que, neste caso como um todo, há qualquer forma de
“direito líquido e certo” a proteger).
2.
Ainda quanto à inadequação da via do Mandado de Segurança por ausência de
“direito líquido e certo” a proteger, Gilmar argumenta que os partidos têm
direito e liquido e certo subjetivo para controlar os atos legislativos e
também os direitos difusos. Para tanto, porém, o Ministro se “reinterpreta” e
diz:
“Eu
mesmo registrei discordância quanto à possibilidade do partido político
impetrar segurança em favor de ‘interesses outros que não os de seus eventuais
filiados’. Percebo que a análise que fiz daquela feita foi excessivamente
restritiva. Os partidos políticos têm finalidades institucionais bem diferentes
das associações e sindicatos. Representam interesses da sociedade, não apenas
dos seus membros. Representam até mesmo aqueles que não lhes destinam voto”.
Ou
seja, Gilmar dá opinião jurídica “a la carte”
3.
Ao firmar entendimento de que a nomeação havia sido efetuada com o objetivo de
“obstruir a justiça”, Mendes diminui a própria Suprema Corte, contradizendo a
mensagem do decano Celso de Mello, para quem os juízes que a compõem seriam
rigorosos e independentes. Se são mesmo, não deveriam se incomodar em receberem
os casos envolvendo Lula, muito pelo contrário.
4.
Gilmar, como é sabido, já prejulgou a causa, tendo dado entrevista à imprensa.
Além disso, há ADPF no Tribunal, ajuizada antes do Mandado de Segurança
decidido por Gilmar e despachada pelo Ministro Teori, que deu vistas às partes.
Decisões de ADPF (modalidade objetiva de ação, situada no âmbito de controle
concentrado de constitucionalidade) têm prevalência em relação a decisões em
Mandado de Segurança. Gilmar sabia disso e poderia ter se abstido de decidir
para não gerar o “manicômio” de que um dia, como AGU, ele reclamou. Como
alternativa, poderia ter submetido o pedido de liminar ao plenário. Ao não
adotar nenhuma dessas medidas, faltou com a prudência e a cautela que o caso
requer de um magistrado.
Eis
aqui uma hipótese bastante plausível a resultar da configuração “manicomial”
conformada por Gilmar para a causa: O processo volta ao Juiz Sergio Moro, que
pode praticar uma série de atos nada triviais, mas a liminar pode ser derrubada
pelo plenário ou por decisão da ADPF e estes atos todos serão questionados.
Bem, talvez isto não importe, depois que Moro já tiver vazado a parte que mais
interessa à sua estratégia.
5.
A liminar sem a manifestação das partes é ILEGAL. A lei do Mandado de Segurança
VEDA a concessão de liminar em Mandado de Segurança Coletivo sem que a suposta
“autoridade coatora” seja ouvida. VEDA. É ILEGAL.
6.
O Mandado de Segurança despachado por Mendes faz parte de um pacote de várias
ações de igual teor. Além disso, é subscrito pela Dra. Marilda Silveira, que
trabalha no IDP, Escola da qual Gilmar é sócio-fundador (figura em anexo), e
foi advogada de Aécio nas eleições. Estamos, assim, por um lado, diante de uma
tentativa evidente de escolha de julgador pelas oposições (curiosamente a
conduta da qual acusam Lula), as quais ajuízam várias ações, com o mesmo teor,
na expectativa de que alguma delas caia para Mendes. E estamos, por outro lado,
diante de um caso evidente de conflito de interesse envolvendo posições
políticas e pessoas do círculo de relações de Gilmar.
7.
Na mesma linha do item anterior, o jornal O Globo denunciou que Gilmar almoçou
com Serra e Armínio Fraga no dia em que despachou esse pedido (foto em anexo).
Se Lula, portanto, reclama nos áudios que nenhuma de suas gestões foi
suficiente para conter o que considerava ser uma perseguição, Gilmar parece
envolvido em história com desfecho oposto: não apenas serve de ponte entre o
STF e as oposições, como decide a favor das oposições e em desrespeito ao
Tribunal.
8.
Dos dois itens anteriores, portanto, resulta que caberia a Gilmar ou,
sucessivamente, ao Tribunal, reconhecer sua suspeição para analisar o caso.
9.
No mérito, vale lembrar que, se há evento histórico no qual o governo federal
claramente agiu para blindar um de seus colaboradores que era alvo de inúmeras
ações judiciais, esse evento envolve ninguém menos que Gilmar. Foi por conta de
ações de improbidade sofridas por Gilmar que o então presidente FHC editou a MP
2316, reeditada nada menos que 37 vezes, atribuindo status de Ministro ao então
chefe da AGU, cargo que Gilmar ocupava (dispositivo em anexo). Ou seja, FHC não
apenas criou uma proteção a Gilmar, como a estendeu por meses a fio por força
de medida provisória, o que não ocorre com Lula.
10.
Igualmente no mérito, Gilmar já proferiu vários votos nos quais manifestou
entendimento de que decisões políticas, como a escolha de Ministros, não devem
ser objeto de controle do STF. Uma delas, lembrava um colega, foi a ADI
1231/DF. Ali, disse Gilmar (fls. 79): “Intento apenas alertar o tribunal para o
problema de declaração de nulidade de uma norma sob o único argumento de que é
imoral ou, melhor dizendo, de que afronta uma indefinida moral pública. Entendo
que, neste caso, estaríamos a penetrar indevidamente no juízo político e ético
do legislador e, consequentemente, a estabelecer uma indesejável vinculação do
direito à moral, que seria muito cara à própria democracia (…)”.
11.
Mas Gilmar recorre a um exemplo mais específico, o “caso Donadon”. O então
deputado renunciou ao cargo quando seu processo já estava em mesa para ser
julgado, ou seja, no intuito visível de escapar do julgamento. Gilmar sugere
que Lula esteja fazendo o mesmo. Mas – sem falar que ao se submeter à Suprema
Corte, Lula tem perdas jurídicas, como a garantia do duplo grau de jurisdição –
fato é que ele sequer é réu, ou seja, não tem “processo” ou “condenação” dos
quais poderia fugir. Se não bastasse, fato é que, mais à frente, o STF reverteu
a decisão do caso Donadon. E fez isto, vamos recordar, quando, ao analisar os
efeitos da renúncia de EDUARDO AZEREDO no caso do “MENSALÃO TUCANO” assim que
Janot pediu sua condenação a 22 anos de prisão, a Corte considerou que NÃO SE
TRATAVA DE FRAUDE.
Quando
afirmamos que estamos vivendo um “golpe”, referimo-nos a um “consórcio” entre
imprensa, setores do empresariado e da classe política, e sistema de justiça,
visando trocar o governo sem passar por eleições. Na nossa visão, tal consórcio
opera por três mecanismos: investigação seletiva da corrupção – a ponto de
termos um denunciado no STF conduzindo o processo de impeachment no Congresso
-; midiatização e vazamentos dirigidos contra o governo; e abuso das formas e
instituições jurídicas. A liminar de Gilmar, concedida nos termos da análise
acima, e proferida às vésperas de recesso judiciário e logo após bem sucedida
manifestação popular em apoio à legalidade, é até agora a mais aguda expressão
desse roteiro.
Por
meses a fio, fomos inflamados por informações sobre Triplex e obras em Sítio,
mas pelo “interrogatório” da PF com Lula vê-se que pouco havia de concreto a
suportar a “tese” de que Lula as havia recebido de empreiteiras, muito menos
como “propina” pelos desvios da Petrobras. A nova ofensiva veio então a partir
da publicização de conversas privadas, gravadas por métodos de legalidade
altamente questionável, que a um só tempo ajudaram a desidratar a liderança
política de Lula e a conter a última cartada de Dilma, que era trazê-lo para
recompor o governo (Aliás, se Dilma quisesse nomear Lula apenas para lhe dar
foro privilegiado, poderia tê-lo nomeado para quaisquer outros Ministérios, e
não o mais importante, voltado à articulação política e à condução
administrativa das tarefas de governo). Se Lula for preso e Dilma cair, terá
sido por essa vil estratégia, mais ainda que por seus diversos erros. Junto com
eles, porém, terão sido vitimados também a democracia e o estado de direito.
Fonte
adicional e leitura recomendada: https://www.nexojornal.com.br/ensaio/2016/A-incomum-decis%C3%A3o-liminar-de-Gilmar-Mendes
Créditos
da foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Fonte:
cartamaior
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