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NOTAS SOBRE O DESPUDOR DA ERA TEMER


247 - A indicação de um ministro para o STF é uma das mais altas e exclusivas prerrogativas do presidente da República. Trata-se da escolha de um juiz que será guardião da Constituição e dos direitos, deveres e garantias dela emanados, não de um auxiliar de governo. Com a morte de Teori Zavascki, entretanto, instalou-se um disputa despudorada entre grupos de interesse para emplacar o nome do novo ministro. E como além do pudor o país está perdendo também a capacidade de espantar-se com as condutas desatinadas, assiste com naturalidade aos movimentos lobistas. Um auxiliar de Temer recebeu uma lista de indicações subscrita por dois juristas que apresentaram o pedido de impeachment da ex-presidente Dilma e por movimentos de extrema direita que participaram da cruzada pelo golpe. Imagine se no tempo de Lula ou Dilma a CUT e outros movimentos sociais fossem ao Planalto fazer lobby pela indicação deste ou daquele nome para o Supremo? Seria um escândalo estrepitoso.

O lobby da Fiesp para emplacar Ives Gandra Filho é outra imoralidade. Em que país civilizado os representantes da elite econômica atuam para emplacar ministros da corte maior de justiça, onde grandes conflitos de interesses, em algum momento, serão julgados? O homem é machista e homofóbico mas o patrocínio de sua indicação é escandaloso. Devia ser. Mas tudo parece natural, assim como a sanha do PSDB e mais cinco partidos para emplacar na vaga de Teori o ministro da Justiça, Alexandre de Morais. 

E por falar nele, voltemos ao despudor. Depois da renúncia dos sete integrantes do Conselho Penitenciário, ele justificou que eram todos ligados ao governo Dilma. E complementou, com absoluto desprezo pela inteligência alheia: o conselho é um órgão de Estado, não de governo. Sendo de Estado, não importa a origem dos conselheiros, e sim a competência e o perfil técnico para integrarem o órgão supervisor da política penitenciária. A trombada dos conselheiros com o ministro foi por conta de sua insistência em transfererir recursos do fundo penitenciário, apesar dos caos nos presídios, para o fundo de segurança pública, que subsidia as atividades policiais. Antes, ele havia ampliado o conselho para obter a maioria, e os novos integrantes lhe rasgaram elogios despudorados. São conselheiros governamentais, não de Estado.

O Supremo, em recesso e ainda sob o choque da morte de Teori, assiste calado ao leilão da toga de Teori no mercado fisiológico. Um de seus ministros, Gilmar Mendes, há tempos perdeu o pudor de explicitar seu alinhamento político e cumpre com naturalidade o papel de conselheiro do presidente da República. Com absoluto despudor, o Planalto faz vazar a informação de que o governo não gostaria que a presidente do STF, Cármem Lúcia, homologasse logo a delação da Odebrecht. O Planalto aproveita a morte de Teori para ganhar tempo em relação à Lava Jato, como disse candidamente o ministro Eliseu Padilha.

A Comissão de Anistia, órgão de Estado, foi renovada para tornar-se um apêndice governamental. Quem tem processos pendentes, por ora esqueça a conquista da reparação por crimes da ditadura. A EBC é um órgão de Estado, responsável pelo sistema de comunicação pública. Virou agência de comunicação governamental chapa branca e cabide de empregos para apaniguados. E assim vamos com o desmonte geral da cultura republicana que ainda era incipiente mas prometia avançar. Mas a roda da História andou para trás.

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