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Ministério Público deve ter poderes absolutos?


Do Brasil247


Não tenho nenhum motivo particular para defender o Ministro da Justiça Alexandre Moraes mas cabe reconhecer que ele tem razão ao questionar a autonomia do ministério público para escolher o Procurador Geral da Republica.

Referindo-se ao processo de escolha do PGR, que a partir do primeiro mandato de Lula se faz pela nomeação do primeiro classificado numa lista tríplice da corporação -- é uma iniciativa voluntária do presidente, sem exigência legal, que foi mantida por Dilma -- em entrevista a Folha Alexandre defendeu outro ponto de vista:

-- O presidente da República tem essa liberdade constitucional (de indicar o procurador-geral que não foi eleito pela categoria) dentro desses requisitos. Não é algo arbitrário. É uma questão de freios e contrapesos. O poder de um Ministério Público é muito grande, mas nenhum poder pode ser absoluto.

A entrevista abriu uma polêmica no governo Temer. O próprio presidente interino saiu em público para corrigir o ministro e sustentar o processo de escolha com base na lista tríplice. Compreende-se a reação de Temer. Ele assumiu o Planalto nas circunstâncias que todos conhecemos e três dias após ser empossado já enfrentou um fim de semana de protestos porque deu entrevista ao Fantástico. Além disso, seu ministério tem três envolvidos nas investigações da Lava Jato no Ministério. Nesta situação a prudência recomenda que não se tome qualquer iniciativa que possa ser interpretada como uma contestação a Ministério Público.

O problema é que o método de escolha do PGR pelo voto dos procuradores implica em subtrair um direito que a Constituição reserva ao presidente da República, como expressão da soberania popular, que está no artigo 1 da Constituição. Não estamos falando de uma posição qualquer. Cabe ao PGR -- e apenas ele -- determinar a abertura investigação contra de autoridades com direito a prerrogativa de foro, o que inclui o presidente da República, senadores e deputados. Escolhido num pleito com um quorum inferior ao de estudantes que escolhem a diretoria de um Diretório universitário, o PGR passa a ter a palavra decisiva nos rumos da República -- que dizem respeito a escolhas feitas por mais de 100 milhões de eleitores.

Como são escolhidos os procuradores? No Brasil, por concurso público. Nos Estados Unidos, em voto dos próprios cidadão para as esferas mais baixas -- pelo presidente dos EUA, quando são procuradores federais. Nos países europeus, o Executivo e/ou Parlamento participam dessa decisão.

Num estudo comparativo sobre a autonomia que o Ministério Público dispõe na Carta de 1988, o dublê de cientista político e jornalista Fábio Kerche demonstrou que em nenhum país do mundo o MP goza de uma situação semelhante. Detalhe: Kerche fez essa constatação, no plano acadêmico, antes que Lula tivesse assumido o compromisso de apenas referendar a escolha do PGR resolvida pelo voto da corporação.

Não foi uma observação isolada. Naquela época, juristas insuspeitos de qualquer simpatia pelo PT revelavam sua preocupação a respeito. Como recordo no livro A Outra História da Lava Jato, já em 1997, a professora da USP Ada Pellegrini Grinover fazia uma crítica direta, a partir de um ponto de vista semelhante.

Falou em "deslumbramento" do MP, que "estaria deixando de exercer sua função essencial, para se colocar equivocadamente no papel de defensores do povo. Para a professora, "a função de defensor do povo é uma extenção do poder político do Congresso. Representante do povo só é quem é escolhido pelo povo e o Ministério Publico não se legitima pelo voto popular no Brasil." 

De lá para cá, o MP apenas reforçou suas atribuições e autonomia. Num processo que ganhou força nos protestos de junho de 2013, os procuradores ganharam apoio popular para derrotar uma Proposta de Emenda Constitucional, a PEC 37, que visava proteger a autonomia da policia na condução de inquéritos policiais. Com isso, os procuradores passaram a conduzir as investigações policiais e a apresentar a denúncia à Justiça, quebrando uma clássica divisão de trabalho entre a autoridade que apura e aquela que acusa.

A partir do prestígio assumido pela atuação na Lava Jato, a força-tarefa percorreu o país para colher assinaturas de apoio a um conjunto de emendas a Constituição que agravam penas no combate a corrupção -- inclusive o artigo, nascido da experiência da tortura e das medidas de exceção da ditadura, que veda o emprego de provas obtidas de modo ilícito. Assim, depois de apurar o denunciar, os procuradores irão atuar com base em leis que eles mesmos ajudaram a criar.

Dificil discordar de um ministro quando diz: "É uma questão de freios e contrapesos. O poder de um Ministério Público é muito grande, mas nenhum poder pode ser absoluto. "

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